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    30 pontos para entender o Caso Rafael Braga

    E os porquês disso ser tão relevante.

    Em junho de 2013, o Brasil parou com a onda de manifestações que tomou o país.

    Mas, o que foi chamado de "festa da democracia" por alguns segmentos da mídia, acabou em tragédia para uma só pessoa:

    Se você ainda não sabe quem é Rafael Braga Vieira e qual a importância de saber sobre, apresento agora 30 motivos pelos quais você deveria prestar mais atenção nessa discussão. Vamos lá?

    1 - A ARTIGO 19, organização não-governamental e internacional de direitos humanos, realizou um levantamento sobre os protestos de 2013:

    2 - Rafael Braga foi o único entre essas 2.608 pessoas a ser preso e condenado após as manifestações de junho de 2013.

    3 - Qualquer um de nós poderia pensar que o cara tava lá pra matar mil, ferrar o patrimônio, meter fogo na Babilônia. Ok. PORÉM, se lermos as notícias até o fim, descobriremos que os tais "artefatos explosivos e inflamáveis" se tratavam dos seguintes elementos de alta periculosidade: uma garrafa de desinfetante da marca Pinho Sol e uma garrafa de água sanitária.

    5 - Se até aqui concordamos que não faz sentido jogar alguém na cadeia por esses motivos, então afinal, o que aconteceu aqui?

    Jovem, negro, pobre e tendo estudado somente até a 5º série, Rafael foi então condenado a 5 anos de prisão, tendo cumprido três deles em regime fechado. E isso nos leva....

    6 - As chances de você ser preso estão diretamente relacionadas com seu grau de escolaridade, classe social, faixa etária e sua raça/cor/etnia.

    Ok, você vai dizer "começou o mimimi".

    Acontece que não sou eu que estou dizendo.

    Quem diz é o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias.

    Segundo consta no documento, produzido em 2014, o perfil da população carcerária não serve para traçar um bom perfil dos criminosos brasileiros, pois os que estão na cadeia são os que passaram por vários filtros que acabam fazendo com que a maioria ali seja no fim negra, pobre e com baixa escolaridade.

    Mas voltaremos a isso depois...

    7 - A maioria da população prisional brasileira possui apenas o ensino fundamental incompleto (53%) e está entre 18 e 29 anos (51%) - a mesma situação de Rafael Braga.

    8 - Esses presos são, sobretudo, negros. No Acre, Amapá, Bahia e Amazonas, aproximadamente nove entre dez presos são negros.

    9 - Isso significa que pobres e negros são naturalmente criminosos e por isso são maioria na prisão?

    10 - Como dito no item 6, esse perfil da população encarcerada é formado por filtros que não condizem com o perfil do criminoso brasileiro em si. Isso se dá pela junção de vários elementos, mas vamos nos centrar em dois deles:

    - perfil

    - seletividade penal

    11 - O primeiro deles, o famosíssimo, porém pouco admitido

    12 - Entretanto, no nosso dia-a-dia podemos encontrar vários agentes da justiça (sem formação para atuar nessa área) utilizando princípios meio tortos do profiling que ninguém do meio gosta de lembrar que já estiveram nos manuais...

    13 - Basicamente, a criminologia - ciência que estuda o crime - teve seu início em 1876 com a obra "Frenologia – O Homem delinquente” de um médico e cientista italiano chamado Cesare Lombroso.

    Se você já assistiu Django Livre, provavelmente se lembra do termo "frenologia" - era a ciência-hobbie do personagem do Leonardo Di Caprio.

    14 - Essa "criminologia primitiva" serviu como uma das bases pra fortalecer aquele papo lá de "seleção dos melhores para purificação da raça", justamente na época em que o regime escravista estava sendo abolido nos países do ocidente... Agora os caras podiam dizer "olha esse cara, olha esses traços! Criminoso natural, tá na cara, vamô segregar, bora descer o braço nesse c...". A criminologia da época se uniu aos estereótipos racistas que formaram o imaginário da escravidão para delimitar quem eram aqueles que mereciam morrer sem direito a defesa, pois afinal, eram naturalmente maus.

    Mas vamos encurtar o assunto.

    Os estudos sobre criminalidade começaram em uma época racista onde era conveniente colocar os negros como um perigo pra sociedade. Esses mesmos estudos influenciaram manuais de criminologia que continuaram a ser publicados décadas e décadas depois.

    Anotamos isso. Ok?

    15 - Mas aí você vai me dizer "pô, mas isso é século passado, evoluímos muito, não acontece mais!", porém...

    16 - Essa discriminação e estigmatização histórica de pessoas negras contribuiu para a marginalização dos mesmos. No Brasil, essa situação faz com que os negros ainda hoje sejam a maioria entre as camadas mais pobres, a maioria em empregos de baixa remuneração, a maioria dos que moram em áreas com pouca infraestrutura e a maioria entre os que não chegam à universidade.

    17 - Especialistas de diversas áreas concordam que a marginalização e pobreza geram violência. Se você não tem motivações, esperanças, estímulo, vive uma série de tragédias pessoais e, pra variar, as pessoas que te olham esperam nada ou pouco de você, é mais difícil seguir dentro do que a sociedade espera.

    Muitos se chocaram com a notícia recente de que um jovem de boa família, com dinheiro e sobrenome alemão acabou entrando em surto e sendo internado em uma clínica psiquiatra. A princípio, a notícia foi veiculada como se o rapaz tivesse sido encontrado vagando pela Cracolância - famosa área de consumo intenso de crack em São Paulo.

    Porém, esse fato não diminuiu a empatia. Todos entenderam que diante de tamanha tragédia pessoal a situação era compreensível.

    Muitos jovens negros e pobres também vivem situações trágicas que os levam a caminhos semelhantes. Entretanto, suas histórias não são vistas nas grande mídias e seus comportamentos acabam sendo lidos como desvios de caráter e não como frutos de uma situação complexa. Esses jovens tem o tal perfil criminoso.

    18 - Já que estamos falando de drogas, então vamos ao próximo ponto:

    E para que a gente consiga entender como isso funciona na prática, vamos fazer um joguinho:

    19 - E isso acontece porque os que ficam mesmo na cadeia, em geral, são aqueles que possuem um pior acesso à defesa.

    20 - Aí você me pergunta: ué, mas a prioridade da justiça não é proteger a vida?

    Se julgarmos apenas pelas porcentagens das condenações, poderíamos afirmar, então, que o nosso sistema jurídico criminal está focado em dois pontos:

    21 - E esses focos são tão fortes que são passados para a população o tempo inteiro. Quem rouba, merece a morte, afinal bandido bom é bandido morto.

    Principalmente se você estiver dentro dele:

    Dele mesmo: o perfil.

    22 - Sabe quando você vê um garoto negro de boné de boa na rua e fica com medo achando que será assaltado? Pois bem…

    Luiz Fernando é um rapaz que se encaixa no perfil: jovem, negro e morador de uma área pobre.

    facebook.com

    De repente, a veiculação de sua imagem é ligada ao que se acredita ser o perfil de um ladrão padrão. E não é preciso que Luiz tenha feito nada para isso. Recebemos sua imagem com um áudio x e aceitamos - por que não seria?

    A partir do momento em que um jovem como Luiz Fernando é identificado como um criminoso por sua cor e aparência, as chances de que sofra violência ou acabe morto sem chances de defesa aumentam.

    23 - Segundo o Mapa da Violência de 2016, a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil.

    Mas quando as noticias chegam até nós, recebemos a informação de um modo onde é fácil deduzir que essas mortes foram merecidas e causadas visando um "bem maior" - o combate à violência.

    24 - Processo semelhante ocorre com quem se envolve com drogas: Deixa de ser humano, um zumbi, um ser sem controle, provavelmente sem empatia. Tu nem racionalidade tem mais, rapá!

    25 - O que nos trás de volta ao assunto principal desse artigo: RAFAEL BRAGA VIEIRA.

    Após várias idas e voltas, Rafael conseguiu o direito à prisão domiciliar, PORÉM, cerca de um mês depois foi novamente preso, em janeiro de 2016. Adivinha sob qual acusação?

    É, isso mesmo.

    Tráfico de drogas.

    E, apesar de:

    1 - Rafael alegar inocência dizendo que havia saído de casa para comprar pão para sua mãe com 3 reais no bolso;

    2 - As únicas testemunhas de acusação arroladas no processo terem sido os policiais que o prenderam;

    3 - Os depoimentos dos polícias estarem cheios de contradições;

    4 - Ele estar usando uma tornozeleira eletrônica com GPS que deliberadamente não foi investigada no processo;

    5 - A quantidade de droga apresentada pela policia como sendo de Rafael ser menor do que 10g;

    6 - Já foi mencionado que o cara estava usando UM G P S??!!!! Um GPS que o juiz decidiu NÃO VERIFICAR????

    Ele acabou condenado a 11 ANOS E 3 MESES DE PRISÃO EM REGIME FECHADO!

    26 - Entretanto, Rafael Braga não é o único a estar na prisão nesse exato momento acusado de tráfico com base em uma pequena quantidade de droga apresentada pela polícia.

    27 - No Brasil e em outras partes do mundo vivemos o que chamamos de uma guerra às drogas. Para “combater o tráfico”, policiais e exército ocupam favelas e periferias atrás dos que eles consideram grandes traficantes.

    Algumas pesquisas de ONGs ligadas à Rede Justiça Criminal, elaboradas a partir da análise de casos em São Paulo e no Rio de Janeiro, completam o quadro:

    A maioria dos presos em flagrante e denunciados por tráfico de drogas é negra, jovem e de baixa escolaridade.

    Além disso, as pesquisas mostram que a maior parte dos presos por tráfico:

    - Não tinha antecedentes criminais;

    - Foi indiciada apenas com base no relato de policiais;

    - Não contou com advogado no momento em que foi apresentada na delegacia.

    28 - Ao mesmo tempo, para pessoas que não cumprem exatamente o perfil, aparentemente traficar drogas não causa assim tantos problemas - pelo contrário - NADA DE ERRADO, SUAVÃO.

    29 - Enquanto tudo isso acontece, pessoas correm risco de vida em meio ao fogo cruzado, a polícia brasileira mata e morre em números alarmantes, famílias são desfeitas, lares despedaçados, vidas e mais vidas perdidas. Mas o tráfico de drogas e a violência não estão diminuindo diante de tudo isso.

    Algo está errado nesse método, afinal, ele simplesmente NÃO FUNCIONA.

    E isso precisa ser discutido e combatido com URGÊNCIA.

    30 - Nesse mês de junho foi lançada a campanha 30DiasPorRafaelBraga.

    Se você concorda que tudo isso precisa mudar, acompanhe as iniciativas que começarão a rolar nas redes e em eventos presenciais.