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    O QUE O MARIO KART ME ENSINOU SOBRE O RACISMO

    O videogame me educou mais sobre racismo do que qualquer instituição de ensino que eu já tenha frequentado...

    ...até porque nunca vi nenhuma escola brasileira te preparar para o racismo, a não ser na prática.

    Enquanto o colégio se empenhou em me ensinar (transmitir conhecimento), torcendo para que isso virasse educação (transmissão de valores éticos), a Nintendo tomou a dianteira no quesito "instrução", insinuando algumas lições sobre a vida. Uma aula de diversidade com um encanador americano com sotaque italiano criado por um japonês. Educação financeira: "Não gaste vida pra pegar moedas, mas gaste moedas para pegar vida" e corridas que zombam da gravidade mas que levam ao conhecimento de políticas sociais. Esse é o caso do Mario Kart.

    Existem até artigos que traçam um perfil psicológico do jogador baseado no piloto que ele escolhe. Por exemplo, eu sempre jogo com o Yoshi. Sempre.

    Mas o que fez com que o jogo alcançasse status de obra-prima do escapismo foi seu - absurdamente alto - fator "replay" (vontade de voltar a jogar) que ao mesmo tempo pode gerar brigas repentinas ou amplificar tensões sexuais mal resolvidas. Ambos os casos terminam com uma pessoa em cima da outra.

    A fórmula básica é simples:

    Primeiro que

    A segunda coisa é simples, mas não simplista.

    A franquia só é divertida pois todo mundo têm as mesmas oportunidades.

    Mas e quando você não tem escolha e precisa jogar?

    Não seria legal que o anfitrião dono do videogame fizesse com que todos se divertissem e não só ele? Que o jogo te desse a possibilidade de correr de igual pra igual com o player 1? Não seria bacana que mesmo que você tivesse 400 anos de desvantagem histórica e sua imagem danificada perante à sociedade deixando você em permanente estado de inércia social, você ainda conseguisse participar da corrida? Jogos são sobre competição. E toda competição é sobre dominação dos rivais, uma hierarquia da sua habilidade sobre as dos demais. Porém a Nintendo deixou isso divertido, bem orquestrado (literalmente, as músicas são fodas), entregando tudo em uma caixinha colorida com letras douradas num papel bonito de entretenimento.

    Com o racismo é a mesma coisa.

    É a sobreposição da sua cultura sobre a dos outros, é a exibição da dominação branca afetando todos os âmbitos da vida das vítimas negras, mesmo que sem querer. A diferença é que não dá pra se divertir, não existe competição e mesmo quando alguém resolve colocar algumas "vantagens" na nossa pista, sempre existe alguém pra dizer que a corrida está injusta. Tudo isso embalado numa caixinha invisível que todos dizem (ou fingem) não existir, mas que na verdade tem 40 metros de altura, paredes de aço com 50cm de espessura revestidas de kevlar, sem uma porta de saída, mas com bonitos Outdoors da Abercrombie na parte de fora.

    Somos 54% dos karts do Brasil,

    porém, além de recebermos 40% menos moedas que os nossos colegas pilotos, 1 a cada 5 negros sequer podem participar da competição, já que são analfabetos. As oficinas mecânicas possuem em seu ferro-velho 75% de sua coleção carcerária sendo negra, porém sem consertar nada nem ninguém. No Mario Kart da vida real não tem restart, 77% dos pilotos jogados para fora da pista permanentemente são negros, sendo um a cada 12 minutos. Isso quer dizer que toda vez que você assiste um episódio de Friends, além de jogar 24 minutos da sua vida no lixo (porque a série é um saco), 2 negros morrem. Ou seja, parem de ver Friends e nos salvem [ risos nervosos ]. Essa foi em homenagem ao Chaves, obrigado Bolaños.

    E mesmo largando na frente

    ainda existem pessoas que acreditam que as cotas e outros power-ups - itens paliativos poderosos para quem ainda está na linha de chegada - são injustos. Porém entendo algumas pessoas serem contra recebermos essas reparações históricas na corrida da vida real, o racismo é prazeroso. Exibir sua vantagem e dominação sobre os demais é legal e quando alguém ameaça nossa superioridade é normal se sentir acuado. A dor é real, "por que alguém pode tirar meu direito de ser o melhor, sem me dar nada em troca?", pois é meu amigo, mas por que precisamos continuar na pista sem as mesmas vantagens que vocês? Toda vez que você se sentir injustiçado por conta de alguma política social alheia é importante procurar olhar para dentro de si mesmo e perguntar "O que estou com medo de perder? Meu controle sobre eles? Meus privilégios? A corrida?" e fazer uma autocrítica em relação à sociedade que você vive ou gostaria de viver.

    E torça para que não peguemos nenhuma Bomb Omb ou explodiremos a competição inteira.

    Essa histórica e injusta disputa só pode ser igualada com as armas necessárias como

    Cotas Raciais, Representatividade nas Mídias, Políticas Sociais efetivas e etc, para que a corrida seja tão divertida e justa pra gente quanto é pra vocês meus amigos brancos, para que exista um fator replay na nossa vida tão alto quanto existe no jogo e que não tenhamos a vontade de ir direto pra tela de Game Over do videogame.

    Agora se você está com a gente e quer que todos se divirtam da mesma maneira e que possam jogar em pé de igualdade, siga a dica do filósofo moderno André Marques e nos ajude a entoar o coro: "Deixa os garoto brincar".