O Ministério Público Federal apresentou, nesta quarta (14), denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no âmbito da Lava Jato.
Numa apresentação com muitos adjetivos, Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa, disse que Lula atuava "como comandante máximo do esquema de corrupção identificado na Lava Jato", era "o grande general" e o "maestro da orquestra criminosa".
Além de Lula, outras sete pessoas foram denunciadas: a mulher dele, Marisa Letícia; o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto; o sócio e ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro, conhecido como Léo Pinheiro, e mais quatro funcionários da OAS.
Caso o juiz federal Sergio Moro aceite a denúncia, Lula se tornará réu pela primeira vez em decorrência das investigações da Operação Lava Jato.
O ex-presidente já é réu por obstrução à Justiça em outro caso, que corre em Brasília, acusado de ter tentado comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró — ele virou delator no âmbito da Lava Jato.
O Ministério Público Federal sustenta que um grande esquema de corrupção envolvendo estatais — incluindo a Petrobras — e ministérios do governo federal funcionou durante os governos de Lula e Dilma.
"Sem o poder de decisão de Lula, este esquema seria impossível", afirmou Dallagnol na tarde desta quarta-feira, ao explicar a denúncia.
Segundo o procurador, havia três objetivos: garantir governabilidade no Congresso Nacional, perpetuar o PT na Presidência da República e desviar dinheiro para benefício próprio dos envolvidos.
Baseado em depoimentos de delatores como o ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) e o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), o chefe da força-tarefa disse que Lula decidia pessoalmente a distribuição de cargos estratégicos a indicados de partidos políticos em troca de apoio no Congresso.
Citando estes delatores, Dallagnol afirmou que o ex-presidente sabia que os partidos usavam estes cargos para arrecadar. Ou, nas palavras de Delcídio, relembradas pelo procurador: "Lula sabia como a roda rodava".
A denúncia cita especificamente três contratos da OAS com a Petrobras, nas refinarias Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, e Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná.
Esses contratos somam R$ 87,6 milhões, de acordo com os procuradores, e envolveram pagamentos de propina a duas diretorias da Petrobras: Abastecimento e Serviços.
Os responsáveis pelas áreas eram respectivamente Paulo Roberto Costa, um dos primeiros delatores da Lava Jato, e Renato Duque, que não fechou delação premiada.
A denúncia não abrangeu os contratos da Lils, a empresa de palestras do ex-presidente, e do Instituto Lula. Juntos, a empresa e a entidade receberam R$ 30 milhões em doações e contratações com empreiteiras envolvidas no petrolão, o que representa mais da metade que o faturamento de ambas desde que Lula deixou a presidência (R$ 55 milhões).
Também ficaram fora da denúncia as obras no sítio frequentado por Lula em Atibaia (SP), pagas pela Odebrecht e pela OAS.
O ex-presidente também é acusado de ter se beneficiado de melhorias que a OAS fez em um tríplex, em Guarujá (SP), e por pagamentos que a empresa realizou para armazenar objetos pessoais do petista.
Lula já havia sido denunciado pelo caso do imóvel, em março, pelo Ministério Público paulista — que, na época, pediu sua prisão.
Ainda em março, a denúncia foi rejeitada pela Justiça de São Paulo, que determinou o envio dos autos à Operação Lava Jato, em Curitiba. Lá, os procuradores continuaram a investigação do Ministério Público paulista.
O petista admitiu ter visitado o apartamento, na intenção de avaliá-lo, mas sustenta que nunca foi o dono. Em novembro de 2015, Marisa Letícia afirmou que a família Lula da Silva pensou em comprar o tríplex, mas desistiu.
O apartamento recebeu benfeitorias incluíndo uma cozinha planejada, um elevador e eletrodomésticos novos. Tudo foi pago pela empreiteira, e os recursos ilegais teriam vindo de contratos com a Petrobras.
No caso do imóvel, o favorecimento ilegal foi calculado em R$ 2,4 milhões. Segundo a acusação, Lula e Marisa Letícia deixaram de pagar as prestações de um imóvel no edifício Solaris em 2009, quando a OAS assumiu a finalização do empreendimento.
Em vez de receberem de volta as cotas ou continuar pagando, Lula e Marisa Letícia ganharam um upgrade: de um apartamento de três quartos, tiveram reservada uma cobertura tríplex. Depois, a OAS pagou a reforma e o mobiliário. A Procuradoria afirma que Lula e a OAS ocultaram que ele era o verdadeiro dono do imóvel.
A construtora ainda pagou R$ 1,3 milhão em armazenamento de bens pessoais do ex-presidente em um depósito em São Paulo. O contrato com a empresa Granero trazia como objeto a guarda de objetos da própria companhia, sem menção a que as caixas pertenciam, de fato, ao ex-presidente Lula.
O edifício Solaris foi construído pela Bancoop, cooperativa habitacional presidida pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, condenado a nove anos de prisão pela Operação Lava Jato, por corrupção passiva.
Depois da denúncia, os advogados de Lula convocaram a imprensa para uma coletiva em que atacaram diretamente o delegado federal do caso, Marcio Anselmo, e Dallagnol.
O advogado Cristiano Zanin Martins usou expressões pejorativas como "farsa lulocêntrica", "deplorável espetáculo de verborragia". E disse que Dallagnol criou um "novo Brasil', no qual "ter amigos e aliados políticos é crime".
Em uma explicação com slides, a defesa insistiu que Lula não é proprietário do triplex. Afirmou que Marisa Letícia mantinha cota do prédio Mar Cantábrico (nome do empreendimento da Bancoop antes da incorporação pela OAS), mas que não adquiriu o imóvel.