A inteligência da Polícia Civil de São Paulo está investigando se Guilherme Taucci, 17, e Luiz Henrique de Castro, 25, tinham ligações com extremistas que operam em fóruns anônimos na deep web ou na dark web – partes da internet só acessíveis com softwares especiais.
Os dois foram responsáveis pelo assassinato de 7 pessoas e feriram outras 11 na Escola Raul Brasil, em Suzano, numa das piores chacinas da história recente do país. Pelo que se sabe até agora, Taucci, que carregava um revólver, matou Castro, que tinha uma besta e uma machadinha, antes de se suicidar.
A 8ª vítima fatal foi Jorge Antonio de Moraes, 51, tio de Taucci. Segundo a polícia, ele foi morto porque o sobrinho não se sentia reconhecido por ele, que havia lhe oferecido um emprego. Taucci foi demitido porque o tio descobriu pequenos furtos.
Fonte policial revelou ao BuzzFeed News que, além de policiais de Suzano, tanto o departamento de inteligência policial como a Delegacia de Crimes Cibernéticos vão atuar nessa linha de investigação.
Nesta quinta, a polícia anunciou que existe um adolescente suspeito de ter ajudado a planejar o massacre, mas que não estava na Raul Brasil. Além deste terceiro suspeito, o ponto de partida é o que foi apreendido até agora, como celulares e computadores. A polícia também já sabe que Taucci e Castro, que moravam no mesmo quarteirão, também frequentavam uma lan house em Suzano.
Depois do massacre de quarta (13), começaram a surgir os primeiros indícios de que Taucci e Castro, ambos ex-alunos da Raul Brasil, discutiram o crime meses antes em um fórum anônimo na “dark web” — parte obscura da internet acessível apenas por softwares especiais.
Na quarta, o portal R7 noticiou que os assassinos usaram o Dogolachan, um fórum anônimo onde usuários compartilham chorume extremista, misógino e racista. Segundo o R7, Luiz Henrique de Castro era conhecido como "luhkrcher666" e Guilherme Taucci como "1guY-55chaN".
Num dos prints de mensagem que o R7 atribui a um dos assassinos de Suzano, ele parece agradecer DPR, o administrador do Dogolachan, pelos "conselhos e orientações".
"Muito obrigado pelos conselhos e orientações, DPR. Esperamos do fundo dos nossos corações não cometer esse ato em vão. (...) Nascemos falhos, mas partiremos como heróis", diz a mensagem.
Que conselhos, que orientações, que ato que não seria cometido em são questões agora para a inteligência da polícia. "Heróis" é como costumam ser referidos, dentro deste submundo, os frequentadores destes fóruns que resolvem transformar a retórica extremista em ataques sangrentos.
Beco escuro
Não é a primeira vez que o Dogolachan emerge. No ano passado, jornalistas da revista Época, que reportaram um grupo de ódio que se articula em torno deste fórum, passaram a ser alvo de ameaças após a publicação da reportagem.
Para o professor Arthur Igreja, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), é mais complicado do que parece encontrar aquilo que os policiais estão buscando. Espaços como esses chan são o extremo da privacidade.
"Os extremistas buscam estes fóruns assim como um ladrão procura agir num beco escuro, para atacar a vítima diminuindo a possibilidade de ser identificado ou reconhecido", disse ao BuzzFeed News.
O professor cita o exemplo do Silk Road, plataforma que operava na deep web a venda de drogas entre 2011 e 2013. Ao só aceitar transações com bitcoins, a criptomoeda, o Silk Road visava dificultar o rastreamento pelas autoridades.
Aparentemente inalcançável, o administrador conhecido como Dread Pirate Roberts cometeu um deslize prosaico: como, ao buscar um especialista de TI que entendesse de bitcoins, ele deixou um endereço do gmail num fórum aberto de programadores especialistas em criptomoeda, pouco antes do Silk Road iniciar as operações com esse tipo de pagamento.
Foi a ponta que permitiu ao FBI puxar o novelo e deslanchar a investigação que levou à prisão Ross Ulbricht, o nome do verdadeiro dono do Silk Road.
No caso de Suzano, a polícia começa a investigação com computadores, celulares e um suspeito de ter planejado que está vivo.
Enterros discretos
Guilherme Taucci e Luiz Henrique de Castro foram enterrados nesta quinta em Suzano, apenas com a presença de alguns familiares.
Luiz Henrique de Castro foi enterrado no mesmo cemitério onde foram sepultadas as suas vítimas, o São Sebastião, porque a família tem um jazigo no local. Já Guilherme foi enterrado em outro cemitério.
Nenhuma das famílias quis velar os assassinos.