O prefeito da Ariquemes (RO), Thiago Flores (PMDB), anunciou na semana passada que iria arrancar as páginas de 1.100 livros didáticos do MEC porque mostram famílias formadas por casais homossexuais.
O anúncio insólito acendeu uma polêmica na cidade de 106 mil habitantes, com ameaças do Ministério Público de processo de improbidade administrativa.
Entusiasmado pelo apoio da maioria dos 13 vereadores da Câmara Municipal, o prefeito anunciou a supressão das páginas de livros do MEC para o ensino fundamental seriam arrancadas porque, segundo ele e os vereadores, incitavam a "ideologia de gênero".
O Ministério Público reagiu à bravata, o prefeito baixou o tom e disse que somente na próxima quinta (2) tomaria a decisão de rasgar as páginas ou comprar novos livros que não contenham informações sobre diversidade familiar.
Na sexta-feira, em reunião com as promotoras Priscila Matzenbacher e Joice Gushy, o prefeito se negou a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta para distribuir os livros que estão guardados desde o ano passado.
Segundo a promotora de Educação e Defesa de Direitos Humanos do Ministério Público, Priscila Matzenbacher, são sete livros de disciplinas como geografia, história e português, organizados pelo MEC e voltados para as crianças do ensino fundamental, com idades de 6 a 9 anos. A cidade tem 16 mil crianças matriculadas no ensino fundamental.
"É uma aberração, algo muito triste. Uma decisão que fragiliza o ensino, incita o ódio e polariza a cidade. Pode significar improbidade administrativa e dano ao patrimônio público, fora o prejuízo moral ao ensino e aos alunos", afirma Priscila.
Na semana passada, quando foram alertadas das ideias do prefeito, as promotoras descobriram que os livros do MEC haviam sido retirados das escolas no ano passado, na gestão anterior.
"Os livros ficaram trancafiados e as crianças ficaram sem material didático", afirmou a promotora, que vai investigar as responsabilidades pelo ocorrido.
A promotora Priscila continua: "Não podemos quantificar quantas crianças foram adotadas nessas condições, mas há muitas na cidade. Fazer o que eles fizeram é dar uma autorização para que essas crianças sofram bullying".
O vereador Amalec da Costa (PSDB), que encabeça o movimento na Câmara contra os livros, disse que os vereadores são contra a "ideologia de gênero".
"Essa ideologia é diferente daquilo que a biologia fala. No pano de fundo, é a [apologia à] homossexualidade", disse o vereador.
Evangélico da igreja Quadrangular e radialista, Amalec disse ao BuzzFeed Brasil que ele e os outros vereadores estão "apenas homologando a vontade do povo, que é tradicional".
O vereador disse que não é homofóbico, mas "como vai se explicar para uma criança de seis anos que dois homens podem ter um filho?"
Amalec negou que a medida alimente o preconceito não só contra homossexuais mas contra crianças adotadas por casais gays.
O vereador disse ao BuzzFeed que o prefeito foi bastante pressionado para não arrancar as páginas e que deve tomar a decisão de suspender a distribuição dos livros.
"Ele vai comprar outros livros, que não tenham essas coisas que não devem ser expostas a uma criança de seis anos de idade", afirmou.
Segundo ele, caso o prefeito aceite a sugestão de comprar novos livros, "que não precisam ser do MEC", os vereadores podem se cotizar para comprar o material "do próprio bolso".