Na terça-feira (29), a primeira turma do STF (Supremo Tribunal Federal) abriu um precedente para a descriminalização do aborto no País, ao decidir, num julgamento de habeas corpus, que o Código Penal viola os direitos fundamentais da mulher ao prever penas de prisão para mulheres e profissionais de saúde que executem uma interrupção voluntária da gravidez.
Houve gritaria de opositores do aborto:
A turma (colegiado de 5 dos 11 ministros da corte) decidia sobre a manutenção ou não da prisão de cinco médicos e enfermeiros de Duque de Caxias (RJ) que foram presos em flagrante e acusados formalmente pelos crimes de provocar aborto com o consentimento da gestante e formação de quadrilha.
No seu voto favorável ao habeas corpus aos réus, o ministro Luís Roberto Barroso considerou que a criminalização do aborto viola os direitos fundamentais da mulher. Ele foi seguido pelos ministros Edson Fachin e Rosa Weber.
A decisão da turma, contudo, não tem o efeito de anular os artigos do Código Penal que prevêem prisão para quem praticar ou ajudar a realizar um aborto. Nem tem o efeito vinculante, isto é, os juízes não são obrigados a seguir o entendimento de Barroso.
Na prática, quando tiverem de julgar casos de aborto, cada juiz poderá ou não levar em conta o precedente aberto pela primeira turma do STF.
O que escreveu Barroso:
A criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria.
A tudo isto se acrescenta o impacto da criminalização sobre as mulheres pobres. É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbitos.