Tomaz Amorim, 31, passou os últimos 12 anos estudando teoria literária alemã nas universidades públicas de São Paulo USP e Unicamp. É especialista em Franz Kafka, aquele autor que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, confundiu com um prato árabe, a kafta. Após nove meses escrevendo seu projeto de pós-doutorado e de passar em 1º lugar no concurso de bolsas do Instituto de Estudos de Linguagem (IEL) da Unicamp, Tomaz perdeu sua bolsa, que já estava garantida.
O corte da bolsa da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), que lhe garantiria um valor mensal de R$ 4,2 mil para ter dedicação integral à pesquisa, aconteceu no último dia 1º. A bolsa simplesmente sumiu do sistema informatizado da Capes, mas não foi a única.
O ministro Weintraub anunciou o corte de metade do orçamento da Capes para o ano que vem e cortou todas as novas 5.600 bolsas que seriam distribuídas para estudantes de mestrado, doutorado e pós-doutorado no Brasil.
"No mês passado eu recebi a notícia que tinha passado em primeiro lugar na Unicamp. Eu fiquei muito feliz de retornar para a universidade onde fiz a graduação e o mestrado. Na minha proposta de pós-doutorado, eu me oferecia para ministrar duas disciplinas. Eu pensei que era uma maneira de retornar aos alunos tudo o que aprendi", contou o pesquisador ao BuzzFeed News nesta quarta-feira (4).
A vaga de pós-doutorado era para apenas um postulante. Como passou em primeiro lugar no concurso, ficou entendido que Tomaz receberia a bolsa. Ele então pediu demissão do emprego porque um bolsista não pode ter vínculo empregatício. Tem de ter dedicação integral ao projeto de pesquisa.
"No dia primeiro, colegas da pós-graduação tentaram ver o andamento da bolsa no sistema da Capes, que estava fora do ar. No dia seguinte, a bolsa já não estava lá. Havia sido cortada sem explicações", contou Tomaz.
"Minha ideia era virar professor universitário. O pós-doutorado, além de nos manter na vida acadêmica, é importante para que possamos buscar vagas como professores universitários, porque os concursos estão cada vez mais concorridos e escassos", afirmou.
"Eu quero dar aula no Brasil. Mas o que vai acontecer é que vou acabar buscando o pós-doutorado na Alemanha. Ou seja: o Estado investiu 12 anos em mim, investiu um dinheiro que não vai conseguir de volta, e eu termino trabalhando na Alemanha. É uma burrice, dinheiro público jogado fora."
O pesquisador defendeu o investimento brasileiro em pesquisa na área de Humanas. "Para mim, isso tem uma relação direta de retorno para a sociedade. A gente está vivendo um momento de retrocesso, de coisas como terraplanismo e crise de vacinas. São questões sociais e culturais. Se a universidade não estiver pensando sobre isso, o nosso futuro como sociedade é a barbárie."