A escola Raul Brasil, de Suzano (SP), cobriu com tinta azul o grafite feito para homenagear os estudantes e as funcionárias mortas no massacre ocorrido em 13 de março.
No dia 25, o muro havia recebido um grafite com o rosto das oito vítimas, feito por um artista plástico que costuma grafitar os muros escolares no Guarujá.
Tomando toda a altura do muro, o desenho do rosto das vítimas do massacre causou impacto sobre estudantes e funcionários, que retomaram a rotina escolar esta semana.
Segundo a Secretaria Estadual de Educação, a decisão da diretoria da Raul Brasil foi apagar a homenagem. Na manhã desta sexta-feira (29), o muro foi coberto com uma camada de tinta azul, a mesma que foi usada para reformar a fachada e o interior do colégio depois do massacre.
De acordo com o jornal Suzano Hoje, o artista plástico Francisco Kleyson havia pedido autorização da direção da escola para fazer a homenagem.
A Secretaria de Educação afirmou ao BuzzFeed News que a direção da escola conversou previamente com o grafiteiro para repintar o muro. Ainda é possível ver o trabalho do artista sob a camada fina de tinta azul colocada pela escola.
Em entrevista à TV Globo, Kleyson contou que costuma usar os muros das escolas no Guarujá para fazer a interação dos alunos com o grafite e, comovido com a tragédia em Suzano, decidiu prestar a homenagem.
Muito grande e muito cedo
Coordenadora do Laboratório de Luto da PUC-SP (LeLu), a psicóloga Maria Helena Pereira Franco afirmou que qualquer homenagem que seja feita em casos como o de Suzano deve ser combinada com a comunidade envolvida, no caso as famílias de alunos e funcionários da Raul Brasil.
“Quem fez a homenagem fez de boa intenção, mas o efeito a gente não sabe. As homenagens e cerimônias têm de ser muito conversadas com as pessoas para avaliar o significado que elas têm para cada um", disse ela ao BuzzFeed News.
"Acho que ficou algo muito grande e talvez ainda cedo", disse a psicóloga sobre o grafite no muro do colégio. Segundo Maria Helena, mesmo pessoas que não foram diretamente afetadas pelo massacre a procuraram para afirmar que o grafite era "muito forte". "Os alunos e famílias dos jovens costumam ser consultados antes de uma homenagem", disse ela, que tem a experiência de tratar de casos de luto coletivo, como a queda do avião da TAM, em 2007.
A culpa de sobrevivente
Maria Helena Franco afirmou que pessoas que escaparam de um massacre ou de uma tragédia podem desenvolver um distúrbio chamado "culpa do sobrevivente".
Na última semana, dois adolescentes que sobreviveram a atiradores em massa em escolas dos Estados Unidos se suicidaram. Em um dos casos, a mãe de uma jovem disse que, além de estresse pós-traumático, a filha sofria com um sentimento de culpa por ter sobrevivido a um ataque enquanto seus colegas foram mortos.
"A culpa do sobrevivente é um risco e é muito forte. Para ser sobrevivente, o jovem nem precisava estar lá na hora do massacre, enfrentar os meninos que assassinaram os colegas. Só de ser aluno já é um sobrevivente."
Maria Helena disse que há sinais que podem alertar pais, amigos e professores desses estudantes em caso de risco. Eis alguns sinais de sofrimento com a "culpa de sobrevivente":
- Quando o jovem não consegue mais fazer coisas prazerosas.
- Quando a pessoa está bem e se sente mal porque estava bem.
- Quando ela evita estar com pessoas que a relacionem à situação vivida.
- Quando ela se coloca em situações de risco que, antes da tragédia, ela evitava.
- Quando o jovem diz algo como "eu que devia ter ido".
Como pedir ajuda
De acordo com o CVV (Centro de Valorização da Vida), o suicídio mata um brasileiro a cada 45 minutos — e poderia ser evitado em 9 de cada 10 casos.
A entidade presta serviço voluntário e gratuito de amparo emocional com discrição. Os telefones são 188 ou 141, de acordo com a região do país. Mais informações: www.cvv.org.br.