O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto considerou "afrontoso" o gesto do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de não receber o oficial de Justiça que lhe entregaria a liminar de afastamento concedida pelo ministro Marco Aurélio de Mello.
A decisão acabou revertida por seis votos a três na sessão do Supremo da última quarta-feira e Renan foi mantido no cargo.
"O que houve de mais lamentável neste episódio foi essa recusa de cumprir a decisão do ministro Marco Aurélio porque não há hierarquia entre decisão judicial monocrática, decisão de turma ou de pleno num tribunal. Deixar de acatar a decisão do ministro Marco Aurélio me soou como afrontoso à autoridade do Supremo", disse Ayres Britto nesta sexta-feira em entrevista em São Paulo.
"O certo era cumprir a decisão e recorrer, se fosse o caso", apontou o ex-ministro, que fez uma palestra no Tribunal de Contas do Estado sobre corrupção.
Ayres Britto afirmou que tanto Marco Aurélio como o ministro Celso de Mello, que, segundo ele, "liderou a divergência" na sessão do Supremo, fizeram defesas bem fundamentadas. No entanto, ele se colocou ao lado de Marco Aurélio, que, em caráter liminar, havia afastado Renan Calheiros.
Ayres Britto apoiou a decisão de Marco Aurélio: "Quando a opção é entre o certo e o certo, a definitiva opção é aquela que tenha a força de imprimir à Constituição maiores ganhos de funcionalidade sistêmica, a que vitaliza mais a Constituição. Eu entendo que é a decisão do ministro Marco Aurélio".
No entanto, o ex-presidente do STF disse não acreditar que a decisão dos ministros do Supremo tenha sido influenciada por algum tipo de acordo com o Palácio do Planalto.
"Nos meus quase dez anos lá, nunca vi nada de acordo com outros membros do Poder. Não acredito nisso. Cada ministro votou de acordo com seu entendimento", afirmou Ayres Britto, que completou: "Ali não houve decisão política de ninguém".
Ayres Britto disse que, sobre o descumprimento da decisão de Marco Aurélio por parte de Renan, o STF poderia tomar algumas medidas. "Esse tipo de afronta, de enfrentamento, caracterizaria crime de desobediência à ordem judicial, outros penalistas dizem que caracterizaria crime de prevaricação ou obstrução da Justiça. Não quero entrar nesse mérito".
Questionado sobre o que aconteceria caso qualquer pessoa se negasse a receber o documento do oficial de Justiça, como fez Renan, Ayres Brito riu e disse: "Você já sabe a resposta".