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Ameaçada de morte, Debora vai usar escolta policial para falar no STF sobre aborto

Debora Diniz defende a descriminalização e aponta que meio milhão de mulheres abortam todos os anos. Sobre as ameaças, diz: "Não acredito que essas sejam as regras do jogo e por isso estou resistindo a elas".

Uma das principais vozes do meio acadêmico pela descriminalização do aborto, a antropóloga Debora Diniz vai discursar nesta sexta-feira (3) no STF (Supremo Tribunal Federal) com escolta da polícia.

Devido a ameaças de morte que recebeu pelas redes sociais, há duas semanas ela deixou sua casa em Brasília e mudou-se, temporariamente, para um local não divulgado, interrompendo sua rotina de trabalho na ONG Anis (Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero).

Debora Diniz é uma das 40 pessoas escolhidas pela ministra do STF Rosa Weber para falar nas duas audiências públicas (na sexta e na segunda, dia 6) que devem nortear o processo sobre a possibilidade de descriminalização do aborto.

Trata-se da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 442, proposta pelo PSOL para discutir especialmente os artigos 124 e 126 do Código Penal, que estabelecem prisão de um a três anos para mulheres que pratiquem o aborto e até quatro anos para quem induzir o ato com consentimento da mulher.

O PSOL defende a descriminalização do aborto feito até 12 semanas da concepção.

A antropóloga é coordenadora da Pesquisa Nacional de Aborto, de 2010, que apontou que 22% das mulheres entre 35 a 39 anos já fizeram aborto. Esse número fica em 6% para mulheres entre 18 e 19 anos e, na média geral, 15% das mulheres entrevistadas afirmaram ter feito um aborto induzido alguma vez na vida.

Estes são alguns dos dados que Debora Diniz vai apresentar ao STF. Ela e o Anis marcaram presença nos momentos recentes da discussão de direitos reprodutivos no Supremo, entre eles a permissão de aborto de fetos anencéfalos a discussão sobre células tronco.

Depois de ter seu nome anunciado para as audiências do STF, Debora passou a receber não só críticas, mas ameaças pelas redes sociais. As mensagens chegavam por WhatsApp.

A pesquisadora procurou a Delegacia das Mulheres (Deam) em Brasília. O caso está sob investigação da delegada-chefe Sandra Gomes Melo. Por meio da assessoria, a policial afirmou apenas que "as investigações se encontram em fase avançada" e que não poderia se pronunciar.

Recolhida para evitar mais ameaças, Debora Diniz concedeu uma entrevista ao BuzzFeed News, em que disse que, apesar dos temores, não desistirá de defender suas posições. Ela confirmou que o governo federal lhe ofereceu apoio dentro do programa de proteção de defensores de direitos humanos ameaçados.

A antropóloga contou que decidiu deixar Brasília "diante do contexto frágil" em que se encontrava. "Em conversa com a polícia eu tomei essa decisão. E, retornando para as audiências públicas, serei acompanhada por proteção."

A pesquisadora afirmou que não cogitou desistir de sua atuação à frente da discriminalização do aborto. "Nunca pensei em desistir. Não quero dizer que isso é parte da militância porque é um equívoco do debate político. Esta é uma forma brutal e agressiva de violência, mas desistir está fora do cenário."

Debora diz que as ameaças não podem ser considerada "do jogo" pelos ativistas.

"Eu não acredito que nenhum ativista, acadêmico, militante precise passar por isso. Não acredito que essas sejam as regras do jogo e por isso estou resistindo a elas. Mas nunca pensei em desistir", reafirmou.

A pesquisadora adiantou um pouco do que será seu discurso no Supremo. "Vou apresentar as evidências que nós temos sobre o perfil da mulher que faz aborto no Brasil. Ela é uma mulher comum, uma a cada cinco mulheres até 40 anos, meio milhão de mulheres a cada ano", afirmou.

Segundo ela, na discussão "há uma pergunta por trás, que é se nós devemos prender essas mulheres". "A resposta da Anis é que não, que a prisão não é uma solução para um problema de necessidade de vida das mulheres. E estamos falando de meio milhão de mulheres, de duplicar o sistema prisional a cada ano."

Do outro lado da tribuna, Janaina Paschoal

Mesmo sem representar nenhuma entidade, a advogada e professora de direito da USP Janaina Paschoal pediu para falar na audiência pública do STF, o que foi aceito pela ministra Rosa Weber. Janaina participa na segunda-feira e fala contra a descriminalização do aborto.

O BuzzFeed News teve acesso ao paper de 44 páginas feito pela advogada, que foi uma das autoras do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Filiada ao PSL, ainda não respondeu ao deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) se será sua vice-presidente na corrida presidencial.

No texto feito para a audiência, Janaina destaca que não considera o STF o foro adequado para a alteração na legislação porque, em sua opinião, o pedido do PSOL propõe na prática a legalização e não a descriminalização do aborto.

Segundo Janaina, "contraditoriamente, em nome do direito à vida, o partido [PSOL] quer impedir vidas".

Ela também diz que haveria um aumento dos gastos da saúde pública com a normatização da prática.

Estão convocadas para falar entidades médicas, de direitos da mulher, de direitos humanos e instituições religiosas.

Debora Diniz, questionada sobre se o STF é o foro adequado para a discussão, afirmou que a Corte "já foi em ocasiões anteriores o fórum de deliberações semelhantes a essa, como foi a união de pessoas do mesmo sexo ou no caso da anencefalia".

Para ela, o STF "está olhando para uma lei de quase um século [de 1940]".

"O STF não está legislando, ele está revisando. Este é um papel da Suprema Corte. Não fazer isso é se eximir de seu dever", disse Debora Diniz.

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