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Moro acusa Bolsonaro de querer interferir na PF, aponta fraude no Diário Oficial e se demite

Ex-ministro diz que presidente quer ter acesso a relatórios de inteligência e inquéritos em andamento – o que é ilegal. Moro nega ter assinado ato de exoneração do chefe da PF – o que, em tese, poderia configurar crime de falsidade material.

Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato, anunciou sua demissão do cargo de ministro da Justiça nesta sexta-feira (24), acusando o presidente Jair Bolsonaro de tentar interferir politicamente no andamento de investigações da Polícia Federal.

Moro afirmou que o presidente queria ter acesso a relatórios de inteligência e sinalizou preocupação com inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF).

"O presidente me disse, mais de uma vez, que queria uma pessoa do seu contato, que ele pudesse ligar, colher relatório de inteligência, e realmente não é o papel da Polícia Federal prestar esse tipo de informação", disse Moro, durante o anúncio na manhã de hoje.

"Imagina se durante a própria Lava Jato, a então presidente Dilma ficasse ligando para o superintende da Polícia Federal em Curitiba para colher informações sobre as investigações?".

As acusações, que são graves, jogam o governo Bolsonaro em um grau inédito de crise política. Moro não citou expressamente nenhum dos filhos do presidente, mas disse que uma das preocupações de Bolsonaro seria com inquéritos que correm no STF.

O ministro Alexandre de Moraes é o relator de dois inquéritos – o das fake news e um recém-aberto sobre os atos pró-intervenção militar. Há suspeitas de que o vereador do Rio Carlos Bolsonaro operaria, de dentro do palácio do Planalto, o chamado "gabinete do ódio".

O agora ex-ministro da Justiça também citou a superintendência da PF no Rio como um dos alvos do desejo de interferência do presidente. É no Rio que corre a investigação sobre o esquema da rachadinha do salário de funcionários da Assembleia Legislativa. O hoje senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente, apareceu nesta investigação.

Moro deixou o cargo depois da exoneração do diretor-geral da Polícia Federal Maurício Valeixo, delegado de sua confiança que atuou na operação Lava Jato no Paraná.

"Na quinta-feira, conversei com o presidente e disse que a troca [de Valeixo] seria uma troca política. E ele disse que sim".

Bolsonaro tuitou o ato de exoneração de Valeixo. Moro disse que, ao contrário do que consta no Diário Oficial, a saída de Valeixo não foi "a pedido" e que ele, Sergio Moro, só soube da demissão do diretor-geral da PF na madrugada.

"Eu não assinei. Fiquei sabendo na madrugada. Em nenhum momento isso foi trazido. Em nenhum momento o diretor geral pediu a exoneração", disse o agora ex-ministro.

"O ex-ministro fez acusações que são gravíssimas sobre o presidente querendo influenciar na condução da PF e ter acesso a documentos sigilosos, o que é ilegal", disse o professor de processo penal da Universidade de São Paulo, Gustavo Badaró, ao BuzzFeed News.

Segundo Badaró, se for comprovado que Valeixo não pediu a exoneração o ato no Diário Oficial poderia configurar, em tese, crime de falsidade material. O nome de Moro aparece na exoneração que ele afirma não ter assinado.

"Em princípio, isso poderia caracterizar a prática de crime de falsidade material, alguém ter usado o nome do Moro", disse o profesor da USP.

- Lei 13.047/2014 “Art. 2º-C. O cargo de Diretor-Geral, NOMEADO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, é privativo de delegado de Polícia Federal integrante da classe especial.”

Crise no governo

Não é a primeira vez que Bolsonaro tenta interferir na Polícia Federal. Em agosto de 2019, Bolsonaro sugeriu uma troca do superintendente da PF no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi.

"Quem manda sou eu, vou deixar bem claro. Eu dou liberdade para os ministros todos, mas quem manda sou eu", disse o presidente, à época. Tal ato repercutiu mal dentro da Polícia Federal, que viu uma ingerência negativa de Bolsonaro e um enfraquecimento do ministro Moro.

Moro é o segundo ministro do governo federal a sair no meio da pandemia de coronavírus. Antes dele, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, foi demitido por Bolsonaro diante divergência pela política de isolamento social e enfrentamento ao coronavírus. O substituto de Mandetta, escolhido por Bolsonaro, foi o médico oncologista Nelson Teich.

Moro ganhou notoriedade como juiz federal da 13ª Vara Criminal de Curitiba, onde eram julgados, em primeira instância, os casos da Lava Jato. Uma das principais decisões de Moro foi a condenação, em julho de 2017, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 9 anos de prisão por corrupção.


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