• newsbr badge

Este lobista briga há mais de uma década para provar que foi laranja do Jucá

"Não adiantou de nada, o único prejudicado fui eu mesmo. Jucá tá numa boa, a cada dia mais prestigiado", disse Geraldo Magela Fernandes da Rocha ao BuzzFeed News. Um inquérito no STF investiga o caso. O senador nega.

Há mais de uma década, o ex-lobista Geraldo Magela Fernandes da Rocha, 66, luta na Justiça para provar que foi usado como laranja pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) na TV Bandeirantes em Roraima, a TV Caburaí. Jucá nega a propriedade da emissora que atualmente pertence a uma empresa que tem como sócios seus filhos.

Até agora, Geraldo Rocha tem falhado em expor ter sido usado pelo senador, não por falta de provas.

O autoproclamado laranja figurou como sócio majoritário da Uyrapurú Comunicações e Publicidade, empresa que controlava a TV Caburaí, entre 1999 e 2009.

O objetivo, segundo ele, era burlar a proibição constitucional de congressistas serem donos ou dirigirem rádios e TVs, que são concessões do governo federal. Mas quem mandava era Jucá.

"Não adiantou de nada [o enfrentamento com o senador], o único prejudicado fui eu mesmo, minha família. Jucá tá numa boa, a cada dia mais prestigiado, a cada dia mais influente", disse Rocha, em entrevista ao BuzzFeed News, na semana passada.

Em 2003, porém, Rocha veio a público dizer que, na verdade, era mero interposto de Jucá. "A empresa foi criada justamente pra isso, pra administrar a televisão", afirma Rocha.

Desde então, o enrosco virou inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal), atualmente sob relatoria do ministro Gilmar Mendes. A partir de 2009, a Uyrapurú deixou de existir e foi encampada por uma terceira empresa que atualmente tem como sócios os filhos de Jucá, Marina e Rodrigo.

Em 2015, a TV Caburaí mudou de nome, passando a se chamar Bandeirantes Roraima.

Conterrâneos do Recife, o ex-lobista e o senador se conhecem desde os anos 1970 e trabalharam juntos na Funai (Fundação Nacional do Índio) durante a presidência de Jucá, entre 1986 e 1988.

"Ele lá [em Roraima] faz chover. Domina a prefeitura, domina um pedaço do governo, domina os órgãos federais todos", diz Rocha sobre o poderoso desafeto.

"É presidente do PMDB. E amigo do Temer."

Funcionários da TV trabalhavam para Jucá

Pouca gente em Roraima duvida de que a TV Caburaí sempre pertenceu a Jucá. O endereço é na primeira casa em que ele morou ao se mudar do Recife para Boa Vista. Quando a emissora foi criada, Jucá era governador do estado (1988-1990) e o dono era um ex-assessor de imprensa do peemedebista.

Empregados contratados pela televisão cumpriam expediente no escritório político do senador.

No inquérito que corre no STF há o relato da faxineira Zilma dos Santos Sousa, que contou ter trabalhado no gabinete de Jucá em Boa Vista, durante depoimento prestado em junho deste ano. Na carteira, porém, era registrada como funcionária da Uyrapurú.

Segundo consta na papelada, Zilma "trabalhava com faxina já há muitos anos em Roraima, sempre em famílias de militares", e conhecia a secretária de Rosilene Brito, atual mulher de Jucá. Ela trabalhou por seis meses no gabinete político dele em Boa Vista, limpando banheiros e servindo cafezinho, mas se desentendeu com Rosilene e mudou de emprego.

O publicitário Ronaldo da Cruz Naves contou à Justiça uma história parecida. Ele se mudou para Roraima no ano 2000, para trabalhar na campanha de Teresa Surita (PMDB), ex-mulher de Jucá, à Prefeitura de Boa Vista — ela é a atual prefeita da capital, cumprindo seu quinto mandato.

Ao fim da campanha vitoriosa da ex-mulher do senador, Naves foi trabalhar como gerente operacional da TV Caburaí. O publicitário disse à Justiça que, nesse período, se reportava apenas a duas pessoas: Romero Jucá e Geraldo Magela Fernandes da Rocha. "O senador Romero Jucá efetivamente participava da gestão da TV Caburaí, inclusive com poder de mando, dando a última palavra na administração", registra o depoimento do ex-funcionário.

A emissora onde ele trabalhava fica na alameda Canarinho, número 21, em Boa Vista. Todas as empresas mencionadas nesta reportagem, ao menos em algum momento, tiveram este endereço em seus registros.

"É a primeira casa de moradia do Jucá em Boa Vista", diz Rocha, o autoproclamado laranja.

Em julho de 2016, a empresa de Rodrigo e Marina Jucá que atualmente é dona da emissora, chamada Societat Participações, teve seu registro transferido de Pernambuco para São Paulo e mudou seu contrato social. Nesse processo, a companhia excluiu uma filial que foi registrada em 2003, situada na alameda Canarinhos, número 21, em Boa Vista. Esta foi a justificativa:

"O sócio informa que a filial localizada na alameda Canarinhos, 21, (...) a qual foi constituída em 10 de novembro de 2003 (...), registrada na Junta Comercial do Distrito Federal (...), nunca entrou em funcionamento, bem como não foi registrada na respectiva Junta Comercial de Roraima, nem inscrita no CNPJ e demais órgãos, ou seja, a filial nunca existiu de fato para os seus devidos fins. Portanto deliberam os sócios retirar a informação da filial do seu respectivo contrato social."

Uma das testemunhas que assinou o documento é Cristiane Andrade Moraes, filiada ao PMDB de Roraima e ex-chefe de gabinete de Rodrigo Jucá na Assembleia Legislativa do Estado. Ela é parente de Gabriel Mota Moraes, assessor que trabalha no gabinete de Romero Jucá em Brasília.

Em nota, a assessoria de imprensa do peemedebista declarou: "O senador Romero Jucá nunca foi dirigente da extinta TV Caburaí. O processo tramita no STF há anos e o senador já cobrou reiteradamente celeridade para sua conclusão."

Aos 66 anos, aposentado, Rocha já não acredita mais que um dia conseguirá provar que Jucá é o dono da TV Caburaí. Mesmo assim, mantém apreço pelo ex-amigo. "Ele é um cara muito capaz, muito eficiente, muito bem organizado. Ele é um gênio", reconhece, antes de pausar e completar o raciocínio: "Pode ser até que seja um gênio do mal, mas ele é um gênio."

"É aquela coisa, né? É você querer enfrentar moinho de vento. Hoje não faria mais nada, não, porque não adiantou de nada. Eu provei tudo. E não adiantou nada."

Veja também:

Mesmo com sede própria, Funasa foi autorizada a alugar prédio de correligionário de ministro

Exclusivo: Cunha disse em proposta de delação que arrecadou R$ 80 mi de caixa dois em 2014

Utilizamos cookies, próprios e de terceiros, que o reconhecem e identificam como um usuário único, para garantir a melhor experiência de navegação, personalizar conteúdo e anúncios, e melhorar o desempenho do nosso site e serviços. Esses Cookies nos permitem coletar alguns dados pessoais sobre você, como sua ID exclusiva atribuída ao seu dispositivo, endereço de IP, tipo de dispositivo e navegador, conteúdos visualizados ou outras ações realizadas usando nossos serviços, país e idioma selecionados, entre outros. Para saber mais sobre nossa política de cookies, acesse link.

Caso não concorde com o uso cookies dessa forma, você deverá ajustar as configurações de seu navegador ou deixar de acessar o nosso site e serviços. Ao continuar com a navegação em nosso site, você aceita o uso de cookies.