A presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, suspendeu o indulto de natal editado pelo presidente Michel Temer com regras que liberavam condenados de cumprir penas.
O indulto é previsto na Constituição e decretos são feitos anualmente desde o governo Fernando Henrique Cardoso. Mas o publicado por Temer para 2017 era sem precedentes: o critério de prazo de pena cumprida é o menor de todos e o condenado nem precisaria pagar a multa que deve pelos crimes que cometeu.
Além disso, o decreto não estipulou pena máxima como regra. Antes, por exemplo, condenados com pena acima de 12 anos não era beneficiados — o que agora seria possível.
De acordo com a decisão da ministra, o indulto é uma espécie de demonstração por parte do Estado de que há uma segunda chance para condenados, mas não pode ser sinônimo de impunidade.
"Indulto não é nem pode ser instrumento de impunidade. [...] Se não for adotado na forma da legislação vigente transmuda-se o indulto em indolência com o crime e insensibilidade com a apreensão social que crê no direito de uma sociedade justa e na qual o erro é punido e o direito respeitado", escreveu a ministra na decisão.
Cármen Lúcia criticou ainda o artigo que liberava o pagamento de multas.
"O indulto tem a finalidade de realizar benignidade com que se contempla aquele que, condenado e tendo cumprido parte da pena a ele definida judicialmente, está em condições de dificuldades humanas (doença, necessidade de reaver sua socialidade pelo implemento do erro purgado pela execução da pena, dentre outros casos). Quanto à multa, pena pecuniária ou valor aplicado por outra causa, não provoca situação de desumanidade ou digno de benignidade".
A decisão da presidente do Supremo atendeu a um pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
Em seu pedido, Dodge afirmava que a medida editada por Temer beneficia criminosos, "muito especialmente determinado grupo de condenados, notadamente aqueles que praticaram crimes contra o patrimônio público, sem qualquer razão humanitária que o justifique”.
O decreto de Temer havia causado a ira de investigadores da Lava Jato, que passaram publicamente a chamar a medida de "insulto de Natal".
Coordenador da operação Lava Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol destacou que Temer foi o primeiro a não estipular uma pena máxima como critério para beneficiar os condenados.
Ex-procurador-geral da República e desafeto de Michel Temer, Rodrigo Janot disse que o indulto era uma tentativa do presidente de acabar com a Lava Jato.
Além da enxurrada de críticas, Temer foi colocado numa sinuca de bico pelo próprio ministro da Justiça, Torquato Jardim. Ele afirmou que a decisão de ter regras mais "liberais" partiu do presidente Temer como resposta ao "momento político".
Para piorar, poucas horas antes da decisão do Supremo, Jardim publicou um artigo criticando o pedido da PGR — o mesmo que foi atendido por Cármen Lúcia.
Assim falou o ministro:
"Indulto é ato de clemência do presidente da República por expressa norma constitucional. Não depende de vontade judicial nem de alvitre do Ministério Público".