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A história desta jornalista expõe direitinho por que as vítimas de assédio têm medo de denunciar
Martha Esteves fez uma reportagem denunciando um ortopedista abusador e, mesmo com provas exibidas na televisão, tentaram desqualificá-la.
Susana Cristalli
Há 5 anos
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A jornalista Martha Esteves contou no Twitter como foi, em 1995, fazer uma reportagem denunciando um médico abusador: não foi uma experiência fácil.
Fiz matéria pro quadro Profissão Repórter para o Fantástico em 1995. Denúncia contra um ortopedista que abusava das mulheres. Fui duas vezes ao PAM em que trabalhava com câmera escondida. Me fiz passar por paciente e aproveitei um problema que tinha no joelho, que operei depois.
Martha hoje é diretora da Associação de Cronistas Esportivos do Rio de Janeiro e na época fez a reportagem para a rede Globo.
Ela foi ao consultório com o intuito de fazer a reportagem, mas agiu como faria uma paciente que realmente precisa de uma consulta. O comportamento inadequado do médico ficou logo evidente.
De cara ele mandou eu tirar TODA A ROUPA. Negociei e fiquei de calcinha (grande e feia, fiz questão) e sutiã com roupão aberto. Ele praticamente me pôs em seu colo, puxando meu quadril. Questionei seu método e explicou que era pra ver minha coluna. Eu: meu problema é o joelho
Guardem esse detalhe sobre a calcinha, ele vai reaparecer mais adiante.
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A matéria ainda mostrava a diferença entre o modo em que o médico examinava homens e mulheres.
@marthaesteves Lembro dessa reportagem perfeitamente, do referido exame, no qual só as mulheres eram instruídas para se despir, um repórter simulou o mesmo problema de joelho, e ele nem aproximou para examinou o suposto paciente
Mesmo tendo se submetido a isso para poder fazer a denúncia, como profissional, a experiência foi tão pesada que ela precisou de muita força para continuar.
Vendo o vídeo na redação percebemos o quanto eram revoltantes as imagens, poderia desistir, mas decidi ir em frente porque pensava nas mulheres que se sentiam inferiores e incapazes de lutar contra o abuso do poder desse médico.
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Mesmo com o abuso comprovado e as imagens exibidas no Fantástico, a Martha é que foi julgada pela sociedade com todas as baixezas que sempre se manifestam, como achar que a mulher que "se aproveitar" de alguma forma.
A matéria foi ao ar (maior audiência até aquele ano), ele foi afastado, mas não punido. Processou a TV Globo e a vários jornais que repercutiram. Mesmo meu rosto não aparecendo, ouvi de gente nas ruas e feiras: é piranha, modelo contratada q depois vai sair na playboy etc.
Isso é um reflexo do lugar comum machista de que mulheres são falsas e interesseiras.
Mesmo num caso no qual a mulher abusada era uma repórter, que estava lá com o objetivo de denunciar, deram um jeito de dizer NO PRÓPRIO TRIBUNAL que ela era responsável pelo próprio abuso.
Ele ganhou o processo contra o jornal que o chamou de tarado na manchete. Eu fiquei frente a frente com ele no tribunal. E o advogado do safado: ela foi de calcinha provocante (quase uma tenda de circo bege), voltou porque gostou etc. Mesmo com imagens, fui desqualificada.
E sim, a roupa da vítima foi usada como suposto atenuante, sendo que ela tomou uma precaução específica com isso.
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O que a Martha está expondo ao relembrar essa história é que denunciar abuso e assédio é uma tarefa dificílima para as vítimas.
Falei um monte. Resumo: sendo jornalista, representando a Globo, ainda fui tratada assim. Vcs acham que mulheres humildes seriam tratadas como? Denunciar assédio e abuso é muito mais difícil do que parece. E a mulher sempre tem culpa, né? Força a todas que foram vítima de abuso,
A cultura estabelecida é a de duvidar de quem denuncia, de expor a vítima a ainda mais humilhação e violência psicológica, e isso só faz os culpados se sentirem seguros e poderosos.
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