Os microplásticos já estão na nossa comida e água, mas ainda não sabemos se eles fazem mal

"Ninguém iria na própria horta despejar petróleo para depois colher e comer o que plantou. Mas, por algum motivo, pelo fato de não vermos necessariamente o microplástico, é exatamente isso que estamos fazendo."

Magnus Larsson / Via Getty

Cada vez mais microplásticos estão sendo encontrados na nossa comida, na água em que bebemos e mesmo dentro do nosso próprio organismo. No entanto, os pesquisadores ainda não sabem qual é o impacto desses fragmentos sobre os ecossistemas e sobre o corpo humano.

No mês de outubro, um estudo descobriu que os microplásticos estão presentes em mais de 90% das marcas de sal de mesa internacionais. Da mesma forma, um estudo-piloto encontrou microplásticos em fezes humanas pela primeira vez, com resultados positivos nos testes de todos os oito participantes, que vieram de várias partes do mundo. Outro estudo publicado no começo de 2018 também descobriu microplásticos em 90% da água vendida engarrafada.

Microplásticos são minúsculos fragmentos de plástico que resultam da decomposição do plástico; o termo inclui também as partículas esfoliantes presentes em cosméticos e fibras de tecidos sintéticos. O tamanho do microplástico varia de cinco milímetros até alguns nanômetros.

Estudos indicam que 99% do plástico lançado no oceano até hoje já se transformou em microplástico e é praticamente invisível ao olho humano.

O agravamento da poluição por partículas de plásticos microscópicas foi descrito pela primeira vez na literatura científica pelo biólogo marinho californiano Ed Carpenter, em 1972. O artigo, publicado pela revista Science, descreveu uma massa de fragmentos minúsculos de plástico flutuando na superfície do oceano Atlântico Norte, e Carpenter especulou que o aumento da produção de plástico iria certamente causar um aumento da quantidade dessas partículas.

Hoje, os microplásticos já estão presentes em praticamente todos os ambientes naturais. Eles foram detectados em abundância nas águas oceânicas, em ambientes de água doce, em terras agrícolas, em suspensão no ar das áreas urbanas e árticas, e congelado no gelo ártico.

Paul Harvey, cientista ambiental da Environmental Science Solutions, disse ao BuzzFeed News que a presença massiva de microplásticos é comparável ao uso industrial desenfreado do chumbo metálico antes da descoberta de que ele estava contaminando a água e o solo. Segundo Harvey, os microplásticos já estão tão presentes no meio ambiente que "parece não existir mais nenhum lugar seguro."

"Esse é um problema em uma escala global e massiva", disse. Mesmo que encontrássemos soluções imediatas para o uso de plástico, segundo ele, ainda teríamos "que enfrentar um legado de 30 a 40 anos de plástico lançado no meio ambiente."

O impacto do microplástico no funcionamento dos organismos vivos não é totalmente compreendido. No entanto, pesquisas começam a indicar que o microplástico pode ter um impacto profundo nas funções celulares devido à contaminação química.

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Aryfahmed / Via Getty

Quando o plástico se decompõe, ele libera diversos elementos químicos, alguns com efeitos tóxicos sobre as células vivas.

Existem duas correntes de pensamento a respeito do efeito do microplástico sobre o organismo: alguns acreditam que o microplástico passa pelo estômago sem sofrer alterações; já outros acreditam que ele sofre corrosão e libera substâncias químicas que são absorvidas pelo tecido ao redor.

Alguns estudos indicam que a ingestão de microplásticos não causa muito impacto sobre certas criaturas marinhas, como a larva do ouriço-do-mar, mas outra pesquisa sugere que espécies com maior taxa de gordura corporal podem ter sua atividade metabólica, sistema reprodutor e as funções cerebrais afetadas. Esse efeito foi observado em espécies marinhas predatórias que se alimentam de peixes menores com altas concentrações de microplásticos no organismo.

Harvey diz que há um aumento nas evidências científicas que suportam a teoria que diz que, quando o plástico é ingerido por animais, essas substâncias químicas potencialmente perigosas são absorvidas pelas partes adiposas dos tecidos.

Isso significa que os microplásticos e as substâncias químicas que eles emitem quando se decompõem estão entrando na cadeia alimentar.

"Ninguém iria na própria horta despejar petróleo sobre suas hortaliças, por exemplo, para depois colher e comer o que plantou," disse Harvey.

"Mas, por algum motivo curioso, pelo fato de não vermos necessariamente o plástico, não percebemos que é exatamente isso que estamos fazendo."

A ingestão de microplástico por meio da cadeia alimentar foi destacada por um estudo, publicado no mês de outubro, que encontrou microplástico, fibras de rayon e fibras de algodão em mexilhões vendidos em supermercados do Reino Unido.

Harvey acredita que o microplástico pode ser absorvido pelo corpo da mesma forma que os bifenilos policlorados (PCB), que foram substâncias químicas amplamente utilizadas como refrigerantes industriais antes de sua regulação em massa. Foi descoberto que os PCBs estavam sendo transferidos por meio do leite materno e eles foram associados ao desenvolvimento de tumores cancerígenos, danos ao sistema nervoso, déficit cognitivo em crianças e comprometimento das funções reprodutoras.

Mesmo sem pesquisas em seres humanos, vários estudos conduzidos em animais indicam que a presença de fragmentos microscópicos de microplástico em vasos sanguíneos de mamíferos (em hamsters, especificamente) pode induzir o surgimento de coágulos sanguíneos e a alteração da atividade cardíaca.

Outros pesquisadores, no entanto, defendem que ainda é muito cedo para tirar conclusões definitivas sobre os riscos dos microplásticos.

Harvey acredita que a produção de plástico ao redor do mundo deve ser reduzida.

"Na União Europeia, por exemplo, o uso de embalagens plásticas descartáveis já foi banido, o que já é um grande passo para a redução da quantidade de plástico despejada no ambiente... se você parar o fluxo de objetos feitos de plástico, então [a criação] de microplástico irá parar também, eventualmente ."

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A tradução deste post (original em inglês) foi editada por Luísa Pessoa.

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