Ao julgar acusado de matar, juiz manda prender mulher por provocar ciúme

    Caso aconteceu em Santos: mergulhador foi condenado a 18 anos por matar músico. Ex-mulher foi presa porque o juiz considerou que ela deixou de ser "pivô" para ser "causa do crime".

    A comerciária Elyse Chiceri, 32, ficou presa seis dias na cadeia feminina de São Vicente, na Baixada Santista, porque comparou o desempenho sexual do ex-marido com o de seu ex-namorado cinco dias antes do primeiro matar o segundo.

    O crime aconteceu em março do ano passado em Santos. E o juiz Edmundo Lellis decidiu prendê-la um dia depois que o ex-marido foi condenado a 18 anos de prisão, na semana passada. Na tarde desta terça (1), ele relaxou a prisão e mandou soltá-la.

    O mergulhador profissional Thiago Batista de Barros, 30, foi condenado no último dia 24 de outubro a 18 anos de prisão por homicídio qualificado: motivo torpe e sem chance de defesa da vítima, o cantor Dan Nunes, da banda Tr3vo.

    Elyse, que tem uma filha pequena com Thiago, disse que mantinha um relacionamento com os dois homens e uma relação tensa com Thiago, que já havia agredido o cantor.

    Antes de namorar Thiago, em 2011, Elyse havia namorado Dan. Os dois retomaram contato em 2014. Em mensagens para Elyse depois que passou a ser ameaçado por Thiago, Dan insistia que não tinha nada com ela.

    Dan foi baleado na porta de um bar de Santos onde fazia shows. Thiago, o ex-marido, passava de carro na porta, estava armado e atirou no vocalista. Ele se apresentou à Justiça três meses depois do crime e foi condenado na semana passada.

    O juiz Lellis Filho decidiu decretar a prisão preventiva de ofício (por conta própria) e contra a vontade do Ministério Público, que sequer cogitou que Elyse tivesse envolvimento com o crime. Ela foi presa em casa, em São Vicente, quando dormia com a filha às seis horas da manhã de quinta-feira.

    Uma prisão surpreendente.

    O BuzzFeed Brasil teve acesso ao mandado de prisão decretado pelo juiz. Nele, Lellis Filho disse que, ao prestar depoimento em juízo, Elyse "surpreendeu pela insensibilidade, portando-se como uma 'estrela', vangloriando-se de suas próprias peripécias sexuais".

    O juiz diz que a jovem tem uma "personalidade exibicionista" e tinha uma "insistência indevida em assediar sexualmente a vítima".

    Ele destaca que Elyse mostrava as mensagens eletrônicas para as amigas para contar vantagem.

    O juiz destacou no processo trocas de mensagens entre o cantor Dan e Elyse, nas quais ele se mostra assustado com as ameaças de Thiago e pede para a mulher desmentir que eles tenham um caso.

    No primeiro momento o juiz queria a prisão preventiva também por ela não ter comparecido ao último julgamento, do qual era testemunha, alegando doença. Mas tanto a Promotoria como o advogado de defesa de Thiago, Alex Oschiendorf, decidiram dispensar o depoimento de Elyse.

    O promotor do caso de homicídio, Cassio Sartori, considerou a prisão irregular e arbitrária porque não há investigação em curso sobre a suposta influência de Elyse no crime. Ele também criticou que o juiz tenha agido por conta própria, sem o pedido do Ministério Público.

    O promotor pediu o arquivamento do caso nesta terça (1), mas o juiz negou.

    Lellis vai remeter a denúncia contra Elyse aos superiores de Sartori porque não concordou com o promotor. No entanto, ele cedeu ao pedido de liberdade feito pelo Ministério Público e relaxou a prisão da comerciária nesta tarde.

    Lellis não quis conceder entrevista ao BuzzFeed sob argumento de que não se pronuncia em relação a casos que estão em andamento.

    Em resposta ao pedido de reconsideração da prisão, o juiz Lellis Filho disse que a mulher fez um "jogo ambíguo" e cita uma frase que teria sido dita por Elyse em uma discussão com o ex-marido: "Ele me come melhor que você".

    O juiz Lellis comparou o caso ao da mulher que, falsamente denunciada em redes sociais em Santos como agressora de crianças, morreu em um linchamento. E decretou a prisão preventiva como garantia da ordem pública.

    Respondendo às críticas do advogado, o juiz Lellis disse que a Constituição preserva o respeito "aos valores éticos e sociais da pessoa e da família".

    Julgamento foi marcado três vezes

    O julgamento de Thiago foi marcado por três vezes, desde setembro passado. O primeiro julgamento foi cancelado porque o advogado do réu ficou doente.

    O segundo julgamento, em 11 de outubro, durou sete horas até que se descobriu que os depoimentos não estavam sendo gravados como pede a lei. A falha técnica anulou o júri; e o último julgamento foi feito no dia 24 passado.

    No julgamento anulado, Elyse testemunhou tanto para a defesa quanto para a acusação.

    O juiz cita este depoimento de Elyse, no dia 11 de outubro. Um dos problemas é que, segundo o advogado, o depoimento não tem valor legal, já que o júri foi anulado.


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