Uma denúncia feita por profissionais de saúde de Pelotas (RS) pôs em xeque a qualidade dos exames de papanicolau feitos nos postos da prefeitura nos últimos anos. O exame é determinante para identificar o câncer do colo de útero.
De acordo com a denúncia, publicada na quinta-feira (12) pelo jornal local Diário da Manhã, em uma das principais UBSs de Pelotas, a do Bom Jesus, os exames têm dado o mesmo resultado, negativo, desde 2014. Com seus nomes preservados pela publicação, os denunciantes afirmaram que os exames têm sido feitos por amostragem, sendo realizados apenas 5 de cada lote de 500.
Em uma denúncia formal, feita há mais de um ano, técnicos da UBS já haviam se queixado à prefeitura, afirmando que entre 2014 e maio de 2017 não apareceu um só resultado de câncer entre os exames realizados no Bom Jesus — e mesmo assim, descobriu-se mais tarde, uma das pacientes, que fizera exames em 2015 e 2017, com resultados normais, estava com câncer.
No primeiro momento, a secretária de Saúde, Ana Lúcia Costa, afirmou que recebera a denúncia apenas de maneira informal há três semanas, mas, depois do aparecimento do documento datado de 2017, ela enviou uma nota à imprensa afirmando que o caso já havia sido apurado pela Vigilância Sanitária no ano passado e que não fora detectado nenhum problema.
O laboratório que presta o serviço, SEG (Serviços Especializados em Ginecologia), confirmou que houve investigação no ano passado e que não foi comprovada irregularidade.
O laboratório está habilitado a fazer até 1.500 exames por mês. A coleta do material é feita pelos postos de saúde e o laboratório recebe R$ 6 para analisar cada lâmina coletada.
"É uma denúncia sem nenhum fundamento", disse ao BuzzFeed News a advogada Cristiane Fonseca, que responde pelo laboratório SEG.
O laboratório pertence à médica ginecologista Claudete Mariza Dias Correa e, segundo a advogada, tem 42 anos de experiência.
A advogada Cristiane confirmou que a denúncia formal foi feita em julho do ano passado, mas negou qualquer irregularidade. Segundo ela, desde a denúncia a empresa ampliou seu controle de qualidade, o que foi dito também pela prefeitura.
Cristiane, no entanto, afirma que o laboratório não pode se responsabilizar pelo que acontece durante a coleta e até que as lâminas com o material coletado cheguem até a empresa. "Nesse caminho até chegar ao laboratório, há manipulação o tempo todo", disse ela, que afirmou que o material deveria ser colhido por médicos, mas o trabalho é feito por profissionais de enfermagem.
A advogada disse que a empresa estava ressentida com a prefeitura e que rescindiria o contrato. Ela afirmou que a secretária está sob fogo cruzado na Câmara por causa de outras denúncias e que o laboratório estaria sendo usado como "jogo político".
Em nota, a Prefeitura de Pelotas afirmou que na segunda-feira receberá um novo relatório da SEG e que desde o ano passado o Departamento de Vigilância Sanitária realizou duas fiscalizações no laboratório, com análise dos relatórios de monitoramento interno de qualidade.
"O SEG entregou a documentação necessária e o seu Alvará Sanitário foi renovado no ano passado, com validade até 23 de novembro deste ano", diz o texto, que prossegue: "A partir da denúncia na imprensa, na quinta-feira (12), a SMS requisitou ao laboratório SEG novos relatórios de qualidade. A empresa se comprometeu em entregar em 24 horas mas, frente à verificação do volume de laudos, disse que entregará a documentação apenas na segunda-feira (16)".
Ainda de acordo com a nota, o setor de Saúde da Mulher não suspendeu o serviço de rastreio e controle do câncer uterino.
A Comissão de Saúde da Câmara, em recesso, fará uma reunião extraordinária na próxima semana, quando o vereador Marcos Ferreira (PT) protocolará um pedido de CPI para investigar o caso. Ele afirmou ao BuzzFeed News que levará a denúncia à polícia e ao Ministério Público.
O Conselho Municipal de Saúde também cobrou providências e informações da prefeitura.