Foi assim que a Colômbia tentou — sem sucesso — alcançar a paz com as Farc
Neste domingo (2), os eleitores rejeitaram um acordo de paz que encerraria mais de 50 anos de guerra civil.
2 de outubro de 2016: Eleitores da Colômbia rejeitam um acordo de paz histórico com o maior grupo rebelde do país, as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), o que encerraria uma guerra civil de cinco décadas.
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O resultado do referendo chocou analistas e observadores, já que se esperava que o apoio ao acordo vencesse por larga margem. Mais de 220 mil pessoas foram mortas e quase 7 milhões tiveram que sair de suas casas devido ao conflito.
Isso foi neste domingo (2). Vale a pena olhar para o passado para entender como o conflito mais longo do hemisfério ocidental quase chegou ao fim — e como seu futuro agora é incerto.
1964: As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, ou Farc, surgem em Tolima, área rural no oeste do país.
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O movimento, fundado por cerca de 50 agricultores cansados da concentração de poder e da desapropriação sistemática de terras em todo o país, é liderado por Manuel Marulanda e Jacobo Arenas.
Eles se juntaram a uma onda de guerrilheiros esquerdistas que surgiram na América Latina durante a década de 1960.
Seu objetivo: uma distribuição mais equitativa da riqueza e do poder para todas os colombianos.
Década de 1970: As Farc começam a crescer e a recrutar pessoas em todo o país. Essa expansão é financiada por meio de sequestros e tráfico de drogas.
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As Farc enfrentam a concorrência de antigos chefões do tráfico de cocaína e de grupos paramilitares de direita. A rivalidade das Farc com esses grupos também deixa centenas de mortos.
1984: O então presidente Belisario Betancur abre negociações de paz com os comandantes das Farc para tentar acabar com o conflito, que já havia deixado milhares de vítimas.
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Depois de duas décadas de luta, as Farc dão sinais de que querem a paz.
A guerrilha se alia a grupos de esquerda moderados para apoiar um novo partido político, a União Patriótica, que consegue ganhar várias cadeiras no Congresso da Colômbia.
No entanto, as negociações colapsam sob o peso da desconfiança mútua, e a União Patriótica não consegue força política.
1990: O cofundador das Farc, Jacobo Arenas, morre de causas naturais. Após uma breve luta pelo poder, Manuel Marulanda assume a liderança do grupo. A década é marcada por uma série de atentados a bomba e assassinatos em massa.
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Marulanda continua como comandante supremo das Farc até sua morte, decorrente de um ataque cardíaco, em 2008.
1991: Negociações de paz entre os líderes das Farc e representantes do governo ocorrem em Caracas, Venezuela. No entanto, como outras tentativas de paz, elas falham.
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Em resposta ao fracasso das negociações, as Farc embarcam em uma enorme campanha de expansão, tomando novos territórios.
1996: Cerca de 600 rebeldes das Farc atacam uma base militar no sul da Colômbia. Os rebeldes sequestram 60 soldados e matam 31.
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Foi o primeiro sequestro em massa que as Farc conseguiram executar.
A Colômbia vê um aumento acentuado no número de sequestros durante a próxima década, e o governo colombiano se propõe a erradicar a principal fonte de financiamento das Farc, seus campos de coca.
1997: Devido à expansão das Farc, vários grupos paramilitares se juntam e lançam uma campanha de guerra total contra a guerrilha e outros grupos de esquerda.
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O novo grupo — as Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) — determina que civis são alvos justos em sua campanha contra os esquerdistas e se torna concorrente das Farc no tráfico de drogas.
Vários representantes do governo colombiano se aliam às AUC, apesar de o grupo ser rotulado como uma organização terrorista pelos EUA e por outros países.
1999: O então presidente Andrés Pastrana dá início a outra tentativa de acordo de paz.
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As negociações levam à criação de uma "zona desmilitarizada" em El Caguán, região no centro-sul da Colômbia. No entanto, o conflito é retomado com o ressurgimento das AUC, com a recusa do governo colombiano em realizar trocas de prisioneiros e com novos sequestros das Farc.
2000: Os Estados Unidos e a Colômbia lançam o "Plano Colômbia", programa para combater o problema duplo de cartéis de drogas e grupos de esquerda como as Farc. O plano inclui a pulverização aérea com herbicidas químicos em grandes partes do país.
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O plano é recebido com ceticismo por defensores de direitos humanos, que acusam as Forças Armadas de violações dos direitos humanos, como execuções extrajudiciais.
Fevereiro de 2002: As Farc sequestram a candidata à Presidência Ingrid Betancourt enquanto ela se preparava para visitar uma zona desmilitarizada entre as Farc e o governo.
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O sequestro da candidata e do senador Jorge Gechem Turbay levam o governo de Pastrana a declarar o fim da zona desmilitarizada e das negociações de paz. Ingrid Betancourt permanece prisioneira das Farc até 2008, quando ela e três reféns americanos são libertados em uma operação ousada em que soldados colombianos se disfarçaram de funcionários de ONGs.
Agosto de 2002: Enquanto o presidente Álvaro Uribe faz seu juramento de posse, prometendo destruir a guerrilha, os militantes atacam o Congresso e o palácio presidencial, deixando 21 mortos.
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2003: Uma bomba mata mais de 30 pessoas em um dos mais exclusivos clubes sociais de Bogotá, popular entre estrangeiros e moradores locais mais ricos.
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Nenhum grupo jamais assumiu a responsabilidade pelo ataque, mas o governo acusou as Farc e julgou vários se seus membros à revelia. Os rebeldes, por sua vez, dizem que o próprio governo plantou a bomba para jogar a opinião pública contra eles.
2008: Depois de 40 anos de violência, o apoio popular às Farc chega ao seu nível mais baixo na Colômbia. Marchas antiFarc atraem milhões de pessoas às ruas, e o Facebook é usado para organizar manifestações em todo o mundo.
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As ruas da Colômbia foram inundadas por pessoas vestidas de branco.
2011: O líder das Farc, Alfonso Cano, é morto em uma operação militar. Cano é o terceiro líder máximo morto desde 2008. Seu substituto, Timoleon Jimenez, entra em contato com o governo para negociações de paz.
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O presidente Juan Manuel Santos, ex-ministro de Defesa de Uribe, insiste que as Farc declarem um cessar-fogo unilateral.
2012: Uma rodada de negociações de paz começa em Oslo, na Noruega, e depois continua em Havana, em Cuba.
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Durante as negociações, as Farc exigem que o governo avance na reforma agrária, que exista um sistema justo para o julgamento de seus guerrilheiros e que o grupo seja aceito como uma força política.
2013: É assinado o primeiro de cinco acordos, sobre direitos da terra e desenvolvimento. Outros acordos da agenda incluem participação política, reparação para as vítimas e políticas de drogas.
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2014: Grupos de vítimas das Farc e suas famílias viajam a Havana para participar de debates sobre como os guerrilheiros responderão à Justiça.
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23 de junho de 2016: As Farc e o governo colombiano assinam um cessar-fogo e um acordo para o desarmamento "definitivo" da guerrilha.
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Após a assinatura, Jimenez declara: "Nunca mais os pais enterrarão seus filhos e suas filhas mortos na guerra."
24 de agosto de 2016: Ambas as partes anunciam que chegaram a um acordo de paz final.
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26 de setembro de 2016: As Farc e o presidente Manuel Santos assinam o acordo de paz final em Cartagena das Índias, cidade na costa caribenha da Colômbia. Mais de uma dúzia de chefes de Estado participam da cerimônia.
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Com o acordo, os membros das Farc se mudariam para várias áreas designadas do país e entregariam suas armas à ONU em um período de seis meses. Alguns ficariam autorizados a se candidatar a cargos políticos. Seriam criados uma Comissão da Verdade e tribunais de justiça especiais onde ex-guerrilheiros seriam julgados. Os que falassem a verdade e confessassem seus crimes receberiam penas brandas e, em alguns casos, poderiam evitar a prisão.
2 de outubro de 2016: Os colombianos vão às urnas para votar a favor ou contra o acordo.
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Apesar de uma pesquisa realizada pelo instituto Ipsos ter sinalizado que 72% da população apoiavam o acordo de paz, o voto pelo "não" ganhou por uma pequena margem de 60 mil votos. Somente 38% dos eleitores colombianos participaram da votação.
Antes do referendo, os representantes das Farc haviam descartado novas negociações. O futuro, por ora, ainda é incerto.