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A pior temporada de incêndios já registrada na Califórnia é um sinal do que ainda está por vir

Intensas rajadas de vento espalharam incêndios de grandes proporções por centenas de quilômetros neste Estado dos EUA — e a situação só tende a piorar.

Incêndios violentos vêm causando uma destruição sem precedentes na Califórnia (EUA) neste ano — e os especialistas afirmam que o fenômeno deve ficar cada vez mais comum e mortal.

Até a sexta-feira passada, seis grandes incêndios estavam cruzando grandes áreas do sul da Califórnia, destruindo bairros inteiros e forçando centenas de milhares de pessoas a deixarem a área. Este surto apareceu no fim de um outono (no hemisfério norte) que deixou pelo menos 44 mortos, tornando 2017 o ano com o maior número de mortes por incêndios na história do Estado.

Esta temporada recorde de incêndios segue a tendência dos últimos anos, em que esses fenômenos ficaram maiores e mais destrutivos. Dos 10 maiores incêndios na história da Califórnia, somente três não ocorreram nos últimos 15 anos. Dos 10 incêndios mais destrutivos que se tem registro, oito ocorreram depois de 2003.

Os incêndios desta semana também já estão chegando aos livros dos recordes. Até sexta-feira, o Incêndio Thomas, que está devastando o Condado de Ventura, já havia queimado 53.000 hectares de terra, tornando-se o maior incêndio durante o mês de dezembro na história da Califórnia.

Os especialistas entrevistados pelo BuzzFeed News afirmam que diversos fatores contribuíram para essa temporada de queimadas. E o que é ainda mais alarmante, nenhum desses fatores deve desaparecer nos próximos anos. O que está acontecendo é o seguinte:

Os ventos de Santa Ana, combinados com um outono extremamente seco, criaram as condições perfeitas para os incêndios florestais.

Os ventos de Santa Ana são os ventos quentes e secos que sopram das montanhas e desertos áridos a leste das cidades costeiras no sul da Califórnia. Daniel Swain, climatologista da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), disse ao BuzzFeed News que os ventos se formam quando um sistema intenso de alta pressão aparece sobre os desertos californianos. Nos últimos dias, os ventos de Santa Ana varreram o sul da Califórnia, propiciando condições "extremas" de incêndio nunca antes vistas.

Para piorar, neste ano os ventos de Santa Ana chegaram durante um período anormalmente seco, já que este seria o início da estação de chuvas. Por isso, a umidade do solo está baixa e a vegetação está muito seca, transformando-se em um combustível para as queimadas.

"O sul da Califórnia está enfrentando uma estiagem", afirmou Swain. "Não houve nenhuma precipitação, o que ainda não é completamente sem precedentes — mas, se continuar assim, será."

A falta de chuvas ocorre devido a um "centro" intenso de alta pressão sobre a Costa Oeste que desviou a umidade para outra região.

Esta é a segunda vez em que ventos quentes e secos criaram condições incendiárias na Califórnia. Os incêndios mortais no início do outono do hemisfério norte — deflagrados nos condados de Sonoma, Napa e Lake — foram levados pelos ventos do Diablo, o equivalente dos ventos de Santa Ana no norte da Califórnia, segundo Yufang Jin, que estuda incêndios e ecossistemas na Universidade da Califórnia em Davis.

As pesquisas sugerem que os fenômenos de ventos quentes e secos na Califórnia — como os de Santa Ana e do Diablo — estão ficando piores com o tempo.

"Esses eventos estão ficando mais intensos", afirmou Jin ao BuzzFeed News. "Se você analisar a umidade relativa e a velocidade do vento, assim como a intensidade desses eventos, há uma tendência."

A mudança climática está provavelmente piorando as coisas.

Jin disse que o motivo por trás da intensificação dos ventos de Santa Ana ainda não está totalmente claro, apesar de que "o aumento na temperatura média poder ser um fator importante". As temperaturas mais quentes vêm ampliando sistematicamente o período de incêndios, disse ela, gerando imensas queimadas em um período no qual o fenômeno não ocorria no passado.

O ano passado foi o mais quente já registrado no mundo pelo terceiro ano consecutivo. E, desde 2000, o recorde da temperatura global anual já foi superado cinco vezes, de acordo com a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA (NOAA).

Já este ano caminha para ser o terceiro ano mais quente da história.

A relação entre as mudanças climáticas e o problema dos incêndios na Califórnia é complexa e abarca muitas questões sem respostas. No entanto, os especialistas afirmam que o clima está ficando mais quente, o que piora as queimadas, já que a vegetação seca vira um combustível para os incêndios e, a longo prazo, exacerba as estiagens — a mais recente durou cinco anos.

"As coisas estão mudando", disse Lynne Tolmachoff, porta-voz do Departamento Florestal e de Incêndios da Califórnia, agência responsável pelo combate de incêndios na Califórnia. "A Terra está mudando."

Uma pesquisa lideradas por Swain sugere uma tendência de maiores centros de alta pressão sobre a Costa Oeste, que foi o que afastou a chuva e deu todas as condições para as queimadas na Califórnia neste ano.

O crescimento populacional em áreas propícias a queimadas transforma pequenos incêndios em verdadeiros infernos.

O aumento populacional em áreas propícias a queimadas também não ajuda. Diversos especialistas entrevistados pelo BuzzFeed News citaram o Incêndio Handley, que atingiu o Condado de Sonoma, Califórnia, em 1964. O incêndio queimou mais de 21 mil hectares de terra e destruiu mais de 100 casas. Porém, isso não é nada que se compare aos incêndios mortais na região do vinho deste ano que, segundo o Departamento Florestal e de Incêndios da Califórnia, mataram 44 pessoas e reduziram milhares de casas a escombros.

A diferença, afirmou Tolmachoff, estava no número de pessoas que viviam na região. "Em 1964, o Incêndio Hanley teve quase a mesma dimensão, mas a grande diferença é que havia bem menos casas em seu caminho", disse.

Em 1960, a população da Califórnia era de apenas 15 milhões de habitantes. Já em 2016, o número atingia quase 40 milhões. Muitos destes novos californianos vivem em um espaço reconhecido como — ou que já foi reconhecido como — a interface urbano-ambiental, onde as cidades fazem limite com zonas de natureza selvagem, muitas das quais são propícias a queimadas.

Volker Radeloff, que estuda a interface urbano-ambiental na Universidade de Wisconsin, disse que a construção em áreas com uma alta probabilidade de incêndios florestais é um padrão encontrado "em toda a Califórnia" e em outras partes dos EUA.

Na Califórnia, os parlamentares promulgaram leis para tornar as comunidades em risco mais seguras, incluindo a exigência de que os proprietários limpem a vegetação ao redor de suas casas e a proibição do uso de certos materiais de construção altamente inflamáveis. Mas Volker disse que essas leis não são infalíveis, já que as cinzas incendiárias podem percorrer até 2,4 quilômetros levadas pelo ar.

Ele também afirmou que o tipo de construção usado na interface piora ainda mais a situação. Os imóveis de baixa densidade que são comuns na região, por exemplo, "possuem mais vegetação inflamável entre as casas", agravando os incêndios que atingem aquela área. E o estilo de vida contemporâneo — lares com menos pessoas, uma proliferação de casas de férias etc. — faz com que existam mais estruturas por pessoa na Califórnia do que antes. Muitas dessas estruturas foram erguidas em locais que provavelmente serão atingidos por incêndios.

"A perspectiva, sinto dizer, não é das melhores", acrescentou Radeloff. "Não vejo uma grande alteração na tendência. Atualmente, percebemos que o número de casas no que chamamos de interface urbano-ambiental aumentou bastante."

Os outros especialistas entrevistados apresentaram pontos de vista semelhantes, incluindo Jin, que disse que as comunidades vizinhas às áreas selvagens deveriam pensar em um planejamento para as queimadas, porque elas são inevitáveis e a "tendência é vermos incêndios mais extremos".

Tolmachoff também caracterizou os incêndios como "apenas parte da paisagem" e que o conflito entre a crescente população da Califórnia e as queimadas só vai aumentar.

"Independentemente do que ocorra, teremos incêndios", disse. "E então você adiciona todos os outros problemas a isso e sem dúvida há um potencial para que a situação piore."



Este post foi traduzido do inglês.

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