Ex-aliado e agora algoz do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senador cassado Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) depôs em uma audiência tensa, presidida pelo juiz Sergio Moro.
Advogados de Lula adotaram uma estratégia de confronto direto contra a testemunha de acusação e contra o próprio juiz Moro, a quem dirigiram, na semana passada, uma queixa-crime pedindo sua punição por abuso de autoridade.
Num dos momentos mais tensos, um dos defensores do ex-presidente insinuou que Moro se comportava com juiz da Alemanha nazista ao querer "eliminar a defesa".
A tensão foi se desenhando na apresentação de sucessivas questões de ordem –em que defensores do ex-presidente acusaram o Ministério Público Federal de induzir Delcídio ou então do procurador interrogar sobre fatos estranhos ao processo.
Delcídio depôs como testemunha de acusação na ação penal em que Lula é acusado de receber a reforma e móveis de um apartamento triplex e ainda ter contas de um armazém pagas pela OAS, uma das principais empreiteiras com obras na Petrobras.
Uma a uma, as questões de ordem apresentadas pelos advogados Juarez Cirino, José Roberto Batochio e Cristiano Zanin Martins foram sendo indeferidas pelo juiz Moro.
Após reconhecer que nunca Lula lhe dera "ousadia" para discutir sobre propinas na Petrobras, Delcídio disse que "toda a torcida do Flamengo sabia" que os indicados para diretorias da estatal tinham de arrecadar dinheiro de propina com empreiteiras para financiar os partidos que os apadrinharam.
O procurador Diogo Castor de Mattos emendou uma pergunta: "Era essa então a regra do jogo?".
Foi a senha para o advogado Juarez Cirino esbravejar: "Questão de ordem: está botando palavras na boca da testemunha!".
Era a terceira interrupção em 15 minutos de audiência. O procurador passou o recibo do incômodo: "Quando vossa excelência for perguntar, pretendo deixar vossa excelência terminar".
Moro mandou seguir o interrogatório. Por pouco tempo. A defesa de Lula voltou à carga quando ouviu Mattos perguntar a Delcídio como era a relação do petista com os empreiteiros.
Nova questão de ordem, nova interrupção. Aí foi Moro que ficou irritado: "A defesa vai ficar interrompendo a cada dois minutos, é inapropriado, doutor, está tumultuando a audiência".
"Pode ser inapropriado, mas está na lei. O juiz preside, mas não é o dono do processo. A defesa tem direito de fazer o uso da palavra pela ordem", rebateu o advogado Batocchio.
E lançou uma provocação direta a Moro, ao compará-lo a um magistrado da Alemanha nazista: "Se vossa excelência quiser eliminar a defesa...E eu imaginei que isso estivesse sepultado em 1945, pelos Aliados, vejo que ressurge aqui nesta região agrícola do nosso país".
Sem subir o tom de voz, Moro repetiu que os advogados de Lula estavam tumultuando e mandou o Ministério Público Federal prosseguir.
"Vai procurar no Google"
Houve novos confrontos quando o juiz indeferiu uma pergunta a Delcídio relacionada ao ex-ministro Antonio Palocci (preso e réu em outra ação penal).
No final da audiência, novo arranca-rabo quando a defesa do ex-presidente ecoou uma antiga tese de que as prisões preventivas coagem suspeitos a virarem delatores. Um dos advogados de Lula perguntou se Delcídio combinou a delação quando estava preso.
"Mas isso é óbvio. Não preciso nem responder isso. Isso é de uma obviedade…", desdenhou o ex-senador.
"O sr. precisa responder. É a pergunta", insistiu o advogado.
Uma voz se levanta fora do microfone: "Isso está no Google. Se o senhor quiser, o senhor bota no Google, se o senhor quiser".
No final, depois de outros desentendimentos, foi Moro que levantou a bandeira branca: "Vamos pedir para tratar com urbanidade todas as partes, inclusive o juiz, certo? Próxima pergunta..."