A cineasta Petra Costa, diretora do documentário "Democracia em Vertigem", disse que, se ela fosse um homem, o apresentador Pedro Bial não a teria tratado como uma menina que fez o filme apenas para a agradar a mãe.
Mas, em entrevista ao BuzzFeed News, Petra não quis chamar diretamente Bial de machista, como fez a principal personagem de "Democracia em Vertigem", a ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Pelo Twitter, Dilma tachou a atitude de Bial, ao fazer comentários sobre Petra Costa, de "machista e misógina".
"Sinceramente eu não tô focando nisso. Mas é claro que eu acho triste que se comente dessa forma", disse Petra, por telefone, de Los Angeles (EUA), onde aguarda a cerimônia do Oscar, na noite de domingo (dia 9).
Nesta semana, em entrevista à Rádio Gaúcha, Bial chamou a cineasta de "uma menina" que fez o documentário "dizendo para a mamãe dela que fez tudo direitinho, que está ali cumprindo as ordens e a inspiração de mamãe".
Petra Costa disse que são "inconstitucionais" os ataques que o perfil oficial do governo federal no Twitter tem feito contra ela, desde que a cineasta deu uma entrevista à CNN em que criticou o governo do presidente Jair Bolsonaro.
"É uma atitude inconstitucional, que fere o artigo 37, como os juristas estão dizendo", afirmou Petra. O artigo 37 da Constituição Federal trata do princípio da impessoalidade da União.
"E é lamentável que isso, essa crítica, aconteça num momento em que a liberdade de expressão tem sido atacada", disse ela, que afirmou que no momento está mais preocupada com a cerimônia do Oscar, "escolhendo vestido", para saber quais medidas legais poderá tomar contra o presidente Jair Bolsonaro.
A cineasta afirmou que o governo erra ao dizer que ela usou fake news em sua entrevista à emissora CNN, nos Estados Unidos, na qual criticou Bolsonaro.
"Se qualquer um for fazer um fact checking do que eu falei poderá dizer que os fatos foram bastante embasados. O assassinato de pessoas no Rio aumento 19% em 2019, assim como o desmatamento, que aumentou e que houve incentivo do governo."
"Tem muita gente vibrando com essa nomeação [ao Oscar]. Essa é uma história não só sobre o Brasil. Mudam os personagens em outros países, mas a história é a mesma com o avanço da direita", afirmou ela.
Petra disse que as críticas têm ampliado o conhecimento das pessoas sobre o documentário. "Eu acho que, quanto mais se discute o filme, mais pessoas assistem e isso é bom, porque cada um tira suas próprias conclusões."
"Minha intenção foi tentar discernir essa nuvem de confusão, do que aconteceu no Brasil nos últimos cinco anos, com fake news e manipulação, e que levou o Brasil a uma crise sem precedentes."
Petra disse discordar das pessoas que consideraram seu documentário muito parcial, favorável a Dilma e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Eu discordo dessa critica porque eu vejo de uma forma diferente. Faço pelo menos umas quatro ou cinco críticas ao PT durante o filme. Mas, pelo falto de mostrar Lula e Dilma em sua intimidade, há pessoas que não conseguem ouvir a minha narração. É muito interessante quando o filme é visto fora do Brasil, porque as pessoas falam: 'como você foi crítica ao PT, como mostrou a corrupção estrutural'. Acho que mesmo dentro do Brasil tem muita gente vendo isso."
Petra diz que o documentário cumpriu seu objetivo. "Eu queria gerar diálogo e romper a bolha", disse.
Para a cineastas, dois documentários são seus maiores adversários no Oscar: o americano "American Factory" e o sírio "For Sama". Mas, de acordo com ela, o que tem acontecido entre os documentaristas, que ontem se reuniram em Los Angeles, é "um espírito de irmandade muito linda".
"O fato de ter quatro mulheres disputando a vaga de melhor documentário me deixa muito feliz de fazer parte desse braço da academia, num momento em que nenhuma mulher disputa a vaga de melhor direção."