Por que seu desejo sexual poderia estar em diferentes níveis neste momento

Uma pesquisa recente do BuzzFeed/Ipsos mostra que a vida sexual não mudou muito durante a pandemia, mas algumas pessoas realmente encontraram seu ritmo sexual agora.

Lauren Tamaki for BuzzFeed News

Há muitas coisas inéditas da quarentena que não esquecerei facilmente. Foi a primeira vez que finalmente fiz pão; a primeira vez que participei de um aniversário no Zoom e percebi que não podia me apresentar casualmente a estranhos sem outras 17 pessoas ouvindo nossa conversa; a primeira vez que corri usando uma máscara facial e perdi o interesse em me exercitar. E, então, houve o momento em que, em algumas chamadas separadas, meus amigos brincaram dizendo que estavam fazendo sexo praticamente sem parar por tédio total — histórias que me fizeram repentinamente questionar minha própria atividade sexual extremamente oscilante.

Afinal, meu parceiro e eu estávamos trancafiados em casa há semanas. Por alguns momentos, me senti como meus amigos que estavam com tesão — principalmente quando ele e eu tínhamos tardes mais livres e calmas ou quando percebi que ele realmente adotaria a tendência do bigode na quarentena. Mas em outras semanas, e provavelmente muito mais frequentemente desde a quarentena, os pensamentos sensuais cessaram notavelmente, mesmo quando eu estava sozinha. Minha baixa libido nesses momentos fazia sentido para mim — tive minhas horas de trabalho reduzidas no emprego que pagava meu aluguel de forma segura; eu estava estressada por ter que buscar mais trabalho quando os orçamentos foram cortados; minha pele estava ficando pior do que no ensino médio; e, como muitas pessoas que conheço, comecei a ter episódios de esgotamento e depressão a partir dessa nova realidade. Então, por que eu senti que era a única pessoa em casa que não estava tendo um grande avanço sexual neste momento?

O psicólogo social Justin Lehmiller explicou ao Vox em abril que "uma porcentagem maior de pessoas agora [diz que] está se masturbando e fazendo mais sexo. Mas você também tem uma porcentagem maior de pessoas dizendo que não estão praticando nenhum comportamento sexual, de maneira alguma". Uma pesquisa do BuzzFeed News/Ipsos, realizada na última semana de maio nos EUA revelou que a maioria das pessoas relata que suas vidas sexuais permaneceram inalteradas desde o início das ordens de ficar em casa. 38% dos americanos relatam não fazer sexo em uma semana normal desde que as ordens de ficar em casa começaram no início de março, em comparação com 33% que relataram o mesmo antes da pandemia. Mas uma coisa é clara: ficar de quarentena indefinidamente tem aumentado bastante os níveis de pânico para algumas pessoas — ao mesmo tempo que os tem reduzido bastante em outras, principalmente naquelas que estão acostumadas a ter ansiedade e depressão em sua vida pré-pandêmica. E, como o desejo sexual e o estresse geralmente estão interligados, é natural que os desejos sexuais de algumas pessoas tenham despencado ou, talvez mais surpreendentemente, tenham atingido novos picos.

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Como o desejo sexual e o estresse geralmente estão interligados, é natural que os desejos sexuais de algumas pessoas tenham despencado ou, talvez mais surpreendentemente, tenham atingido novos picos.

"Estamos fazendo mais sexo do que jamais fizemos desde que estávamos na faculdade e na escola de medicina há mais de 10 anos", disse Vanessa, uma mulher de 31 anos casada com um médico e mãe de dois filhos pequenos em Sag Harbor, Nova York. "Transamos agora uma ou duas vezes por dia, e até temos dado algumas rapidinhas durante o dia nos fins de semana — algo que também não fazíamos há muito tempo." Antes da pandemia, ela diz que eles transavam duas a três vezes por semana no máximo, mas, ultimamente, pouco antes da quarentena, estavam cansados demais e podiam passar até duas semanas sem sexo. Embora seu marido esteja, na verdade, trabalhando significativamente mais horas agora, Vanessa creditou seu novo aumento de libido a passar a maior parte do dia em casa (exceto para fazer exercícios e trabalhar no quintal).

"Para algumas pessoas, esse senso de 'aninhamento' cria essa capacidade de cultivar o desejo de fazer sexo", disse Erica Chidi, doula e cofundadora/CEO do LOOM, um centro de bem-estar e educação sexual com sede em Los Angeles. Por exemplo, as pessoas que se encontram em um local de relativa estabilidade neste momento podem ter um aumento do desejo sexual simplesmente por terem mais tempo para descansar e cuidar de suas outras necessidades em primeiro lugar.

"Imagino que, antes, eu teria pensado que deveria me masturbar e acabar logo com isso, porque tenho todas essas outras coisas para fazer", disse Jessica*, professora universitária de 35 anos que mora sozinha em Chicago. Antes do distanciamento social, ela havia saído algumas vezes com alguém e continuado a comunicação depois de terem que ficar de quarentena em suas respectivas casas. "Começamos a fazer sexo por mensagens de telefone e enviar nudes — eu nunca tinha feito isso", disse ela. "Estranhamente, acho que o fato de estar sozinha e entediada me fez explorar um pouco a mim mesma e o que eu queria."

Claro que isso não quer dizer que um maior desejo sexual signifique que uma pessoa não está preocupada ou emocionalmente afetada pelo que está acontecendo ao seu redor. "Estou superpreocupada com outras coisas, como meus pais que moram longe", acrescentou Jessica. "Mas não sinto que apressar minha atividade sexual me ajudará a ficar menos estressada, por isso estou indo no meu ritmo, acho." De qualquer forma, sabe-se que o sexo é um aliviador de estresse confiável, por isso faz sentido muitas pessoas se voltarem para ele ainda mais agora.

É óbvio que os níveis de estresse de cada um — e reação ao estresse — variam muito e, em circunstâncias jamais vistas, é fácil ter a reação oposta: uma cessão completa da excitação. "Quantidades menores de adrenalina e ansiedade podem aumentar o desejo sexual de uma pessoa, mas muito estresse inunda o corpo com cortisol, que tem vários efeitos fisiológicos que diminuem a libido", explicou a psicóloga e especialista em sexo Antonia Hall. "Portanto, embora o sexo seja um fantástico aliviador de estresse natural, muito estresse geralmente deixa as pessoas com pouco ou nenhum desejo sexual."

Para Chloe*, de 25 anos, que mora com o namorado em Nova Jérsei, a pandemia já afetou os empregos dela e de seu parceiro. O namorado dela perdeu o emprego no restaurante, enquanto ela equilibrou um emprego semanal regular com um emprego de fim de semana e aulas particulares. "No começo, eu pensei que seria sexo todo o tempo todo", disse ela, especialmente porque o namorado normalmente trabalhava no turno da noite e agora estava mais em casa. "Eu quero excitá-lo, mas estou tendo dificuldades para encontrar a motivação para me animar e ficar 'sexy'." Não surpreende que seja difícil ter o sexo em mente quando o desemprego impactou uma pessoa no relacionamento. "Estou estressada com dinheiro, com o futuro do meu trabalho e da minha carreira em geral após essa pandemia", disse ela.

"Estes são tempos jamais vistos, e ter uma redução no desejo sexual é totalmente normal", disse Hall, que recomendou conexões simples e não sexuais — algo que Chloe e seu namorado têm feito muito. Depois de transar muito na primeira semana de quarentena, "nós nos tornamos extremamente íntimos com abraços, comunicação e apenas desfrutando a companhia um do outro", observou ela.

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"Estes são tempos jamais vistos, e ter uma redução no desejo sexual é totalmente normal." 

"As pessoas ainda estão enfrentando luto e choque", disse Chidi, que enfatizou que não deveria haver pressão para fazer sexo neste momento. "O sexo é um desejo, não um impulso como fome, sede ou sono." Além disso, acreditar que o sexo precisa envolver especificamente relações sexuais ou um orgasmo — e, portanto, quantificar quantas vezes você tem isso por semana em comparação com todas as outras pessoas — mecaniza-o de uma maneira que, ironicamente, possa tirar a sensualidade do sexo. Como a famosa terapeuta sexual Esther Perel disse uma vez na revista GQ, "as preliminares começam no final do orgasmo anterior" e podem significar muitas coisas. É por isso que Chidi recomendou se reconectar lentamente com o seu corpo de pequenas maneiras — por exemplo, prestando atenção à água na sua pele quando você estiver no banho. Masturbar-se — seja morando sozinha ou até mesmo se você mora com seu parceiro, mas quer um tempo sozinha — é outra ótima maneira de sentir a si mesma, especialmente, ela acrescentou, em um momento em que o parceiro sexual mais seguro normalmente é você mesma.

"Como há muita coisa acontecendo, isso se transforma em um 'acho que vou me masturbar'", disse Stephanie*, de 28 anos, que está sozinha em seu apartamento em Nova Iorque desde que sua colega de quarto foi embora. "Não é necessariamente porque estou com tesão, mas estou ansiando uma conexão", observou ela. "Ouvir erotismo em áudio e me masturbar é o mais próximo que posso chegar disso neste momento." Além disso, há também um sentimento de alívio de tensão: "Acho que, mesmo com a corrida, tenho essa frustração reprimida de que realmente não sei como liberar", disse ela.

Por mais frustrante que possa ser ter desejos sexuais não correspondidos, Hall disse que pode ser um momento perfeito para abrir-se com conversas mais profundas sobre o relacionamento como um todo. "Muitas pessoas encontram-se comunicando mais porque estão de quarentena juntas, de modo que todas as conversas que estavam sendo adiadas estão vindo à tona agora", disse ela. "É um ótimo momento para os casais enfrentarem desafios, reconectarem-se e descobrirem novas maneiras de desfrutar um do outro." O benefício oculto? "Existem inúmeros estudos que mostram que a comunicação leva a uma vida sexual melhor", disse Hall.

Para alguns casais, conversar mais um com o outro, em geral, também tem levado a conversas sobre sexo. Rebecca, uma mulher de 29 anos em Nova Jérsei, estava inicialmente em quarentena separada do namorado de seis meses, que é um enfermeiro de hospital que recentemente se recuperou de COVID-19. Apesar de estarem afastados um do outro por tanto tempo, eles se tornaram muito mais próximos — até mesmo sexualmente. "Vimos um grande aumento em nossos desejos sexuais", disse ela. "Tipo, uma quantidade insana, o que é estranho, porque não conseguimos nos ver há semanas."

Ela creditou isso em grande parte à "introspecção celibatária forçada" de estarem separados. "Tem sido uma oportunidade para nos abrirmos sobre nossas necessidades íntimas e conversar sobre fantasias e coisas que queremos fazer quando pudermos nos ver novamente", disse Rebecca. Eles também lidaram com o fato de terem diferentes estilos de comunicação — algo que Rebecca disse, semanas depois, que os ajudou ainda mais à medida que a vida ficou mais difícil.

"Tenho pesquisado como lidar com segurança e de forma solidária com um parceiro com TEPT e estabelecemos rotinas de comunicação", disse ela. "Então, agora, a comunicação íntima está sendo o oposto dos nossos pontos de contato regulares, e nós dois estamos tentando manter a cabeça dele acima da água até a onda passar." Como os casos têm diminuído em Nova Jersei, ela tem conseguido convidar o namorado para sua casa para descontrair, e programado atividades relaxantes, como caminhadas, andar de caiaque e dias "sem tecnologia".

"Definitivamente, continue mantendo as linhas de comunicação abertas", aconselhou Hall. "Observe o que você está fazendo mais agora que melhora sua vida e a de seu parceiro, e priorize essas coisas no futuro, de forma que, quando a vida voltar a melhorar, você terá uma rotina com mais alento e amparo para você." Para alguns, como Vanessa e seu marido, a esperança é que eles possam manter sua rotina sexual de quarentena muito tempo após o término da pandemia, mesmo quando a vida ficar mais movimentada novamente. Ela e o marido "diminuíram o ritmo um pouco agora, em média duas a três vezes por semana", com o calor deixando os dois mais cansados do que o habitual. "Na verdade, tenho 'desmaiado' no sofá três noites por semana", disse ela, acrescentando que ela e o marido têm se revezado cochilando todos os dias. No entanto, ela ainda credita o aumento do sexo na quarentena como algo que melhorou o relacionamento deles a longo prazo. "Isso nos lembrou que nós dois devemos ter sentido muita falta um do outro", disse ela. "Acho que também nos ajudou a aliviar o estresse e a tensão de forças externas com nossas carreiras."

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"A quarentena parece me dar tempo e espaço para experimentar coisas que eu poderia desfrutar, sem a pressão de também desfrutar delas pelo meu parceiro sexual."

Jessica mencionou como, antes de ficar em casa, ela "raramente usava lingerie", mas agora a veste e se sente muito excitada. "A quarentena parece me dar tempo e espaço para experimentar coisas que eu poderia desfrutar, sem a pressão de também desfrutar delas pelo meu parceiro sexual", explicou ela. Desde o final de abril, ela "decidiu quebrar a quarentena com um amigo" — alguém por quem ela diz que não tem certeza se se sentiria tão atraída em circunstâncias normais, mas que agora acha um parceiro sexual seguro e divertido. Ao mesmo tempo, ela continuou a aumentar sua coleção de lingeries "pequena, mas bonita" e, embora seu parceiro atual não curta, ela se sente ótima e como se ainda estivesse explorando seus desejos.

Stephanie tem tido uma experiência semelhante — como ela está tomando antidepressivos, e atingir o clímax pode levar mais tempo do que o habitual, "levando 45 minutos no meio do dia, e descobrir o que eu gosto simplesmente não parece um crime enorme do modo como costumava parecer", ela disse.

Para Chloe, mesmo que semanas sem sexo com seu parceiro "não sejam comuns no relacionamento [deles]", ela diz que sua ligação com o namorado só tem fortalecido, corroborando com 81% dos entrevistados da pesquisa do BuzzFeed News/Ipsos que achavam que podiam ser "completamente honestos com o parceiro agora". "Estou adorando tê-lo por perto e ao meu lado para me apoiar como companheiro de quarto, companhia, melhor amigo, alma gêmea e qualquer outra 'função' que ele esteja ocupando agora, já que estamos seguros em casa juntos."

Mais do que tudo, o tema principal presente em todas essas histórias é a ideia de flexibilidade e paciência. "A sexualidade é complexa, com muitas variáveis — física, fisiológica, psicológica e no relacionamento — que podem aumentar e diminuir o desejo", disse Hall. A libido de uma pessoa não é feita para ser inabalável nem resistente a forças externas e, só porque as primeiras semanas de quarentena podem ter sido monótonas em termo de 'revitalização', isso não significa que a vida — e seu relacionamento com sexo — não possa mudar momento a momento. Tudo, desde protestar contra a brutalidade policial, a se perguntar sobre o seu futuro, a se preocupar se você está doente, a brigar com seu cônjuge, a ser despejado, a equilibrar trabalho e educação em casa, a se sentir incrivelmente sozinho, pode repentinamente alterar sua disposição sexual e não sexual de maneiras que você jamais havia vivido antes. O mesmo vale para as coisas que retornam lentamente ao "normal" à medida que os procedimentos de lockdown se abrandam: se a sua realidade anterior à pandemia envolvia trabalhar longas horas, suportar deslocamentos tediosos e/ou criar filhos ao mesmo tempo, um retorno a um nível mais baixo de desejo sexual pode ser um sinal claro de que sua agenda atual não oferece tempo ou energia para você se sentir sexual.

Se ficar em casa nos ensinou alguma coisa, é que restaurar o desejo pela vida — e o desejo pelo desejo — exige maior autocompaixão e nos dá espaço para descobrirmos o que queremos. "Tente se concentrar em maneiras de cuidar de si que sejam boas para o seu corpo", disse Hall. "Com mais cuidado, seu sistema nervoso relaxará." Este período pode ser um momento crucial na maneira como encaramos nosso bem-estar sexual, físico e emocional. E isso deve acontecer logo. ●

*Os nomes foram alterados.

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Julia Pugachevsky é uma escritora freelance com crédito na VICE, Forge, Glamour, Cosmopolitan, BuzzFeed e INSIDER. Ela é ex-editora de sexo e relacionamentos da Cosmopolitan, e editora de amor e relacionamentos do BuzzFeed.

Este post foi traduzido do inglês.

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