Quem passou pela graduação em algum curso de humanidades nas últimas décadas provavelmente se deparou com "O Fim da História e o Último Homem" (1992), seminal tratado no qual o filósofo nipo-americano Francis Fukuyama proclamou que o colapso das ditaduras comunistas na Rússia e no Leste Europeu foi sucedida pela vitória definitiva das democracias liberais no Ocidente.
O livro foi a versão mais refinada das ideias que Fukuyama esboçara no ensaio "O Fim da História", publicado meses antes da queda do Muro de Berlim (1989). São provavelmente as 18 páginas mais citadas e menos lidas da história recente.
Nele e no livro, o pensador desmonta a crítica de Marx a Hegel e defende que a economia é uma estrutura derivada das ideias, não o contrário, como pregava o autor de "O Capital" (1867) e do "Manifesto Comunista" (1848).
Nos dois textos, Fukuyama defendeu que a economia de mercado e seu par na política, a democracia representativa, são os estágios finais da evolução das sociedades. Como seus estágios finais, só restaria a elas, as sociedades, aperfeiçoá-los. Quase imediatamente, Fukuyama passou a ser uma celebridade neoliberal, amado pela direita e detestado pela esquerda.
Estas credenciais conservadoras, contudo, não foram o suficiente para que ele estivesse a salvo de ser acusado, por internautas brasileiros, notadamente autoproclamados eleitores de Jair Bolsonaro, de ser adepto do... comunismo. Nesta quarta-feira, Francis Fukuyama usou o Twitter para ironizar a situação nonsense.
"Muitos brasileiros parecem pensar que eu sou um comunista porque eu estou preocupado com uma vitória do Bolsonaro. E vocês aí pensando que eram os americanos que estavam polarizados..."
As acusações da suposta conversão de Fukuayama ao credo que tanto combateu começaram depois que ele deu uma entrevista ao caderno "Ilustríssima", da Folha de S.Paulo, na qual ele afirma que Jair Bolsonaro (PSL), assim como outros líderes populistas pelo planeta, é uma ameaça à democracia. Leia aqui.
A tese de Fukuyama é que a democracia liberal está fundada sobre a concentração de poder pelo Estado, a igualdade dos cidadãos perante a lei e as eleições livres. Segundo ele, líderes populistas usam as eleições livres para alcançar o poder e, a partir da legitimidade dos votos, atacar a própria democracia.
"Bolsonaro representa uma verdadeira ameaça à democracia. Subjacente a isso, há uma polarização social no Brasil, que transformou em luta ideológica o que começou como campanha anticorrupção", disse à Folha na entrevista.
Foi a partir daí que o pensador começou a ser associado ao comunismo nas redes sociais do Brasil.