• newsbr badge

Agora em um abrigo, famílias que estavam no Paissandu convivem com toque de recolher e muros

Um jovem de 20 anos diz que se chocou com as regras do lugar, como o de fechamento dos portões, às 21h. “Eles estão tratando a gente como sem-teto. Mas a gente não era sem-teto antes da nossa casa cair”, diz. “Eu pagava aluguel.” Prefeitura diz que sempre manteve as famílias informadas.

Depois de três meses acampados no Paissandu, largo no centro de São Paulo onde em 1° de maio um prédio pegou fogo e ruiu, dezenas de famílias passaram seu primeiro fim de semana sob um teto. Estão em um abrigo da prefeitura, onde têm direito a três refeições por dia, mas são obrigados a seguir horários.

O Centro Temporário de Acolhida Canindé fica no bairro do mesmo nome, atrás do estádio da Portuguesa, e foi para onde foram quase 40 pessoas que ficaram em barracas até a última sexta (10), cem dias após a tragédia.

A Prefeitura de São Paulo afirma que essas famílias não comprovaram morar no edifício Wilton Paes de Almeida quando ele pegou fogo — a gestão diz que as 291 famílias que comprovaram viver no prédio receberão auxílio-aluguel de R$ 400 por 12 meses (após uma primeira parcela de R$ 1.200).

A estrutura que encontraram no abrigo, dizem os novos moradores, era a prometida pelo então prefeito João Doria em vídeo compartilhado nas redes sociais: cada quarto tem uma cama de casal e um beliche, com roupa de cama e cobertores.

Os banheiros são limpos e têm água quente (a temperatura em São Paulo chegou a 11°C na madrugada de domingo). Todos os móveis são novos e há um canil para bichos de estimação.

Veja este vídeo no YouTube

youtube.com

Vídeo em que o então prefeito João Doria (PSDB) apresentou o CTA, aberto há poucas semanas.

“Não sabia que era um abrigo”

Mas o processo da mudança careceu de diálogo, afirmaram mais de dez dos moradores do novo CTA ao BuzzFeed News. Todos pediram que seus nomes fossem preservados em sigilo, porque não querem arriscar serem expulsos dali. A entrada da imprensa não é permitida.

Em conversas fora do centro, moradores disseram que o principal empecilho no processo, até agora, foi descobrirem que iam morar num abrigo só quando chegaram ao local, levados por carros da prefeitura. “Disseram que iam ser quitinetes em um prédio. Mas não disseram que o prédio ia ser um centro de acolhida.”

Um outro morador afirma que se chocou com as regras do lugar, como o de fechamento dos portões, às 21h. “Eles estão tratando a gente como sem-teto. Mas a gente não era sem-teto antes da nossa casa cair”, diz um jovem de 20 anos. “Eu pagava aluguel.”

Ele afirma não discordar das normas do centro (“faz sentido”), mas que elas não haviam sido compartilhadas com o grupo durante as negociações com a prefeitura.

Os moradores relatam ser acordados às 6h, com funcionários os chamando para tomar café da manhã. Depois do café, há uma reunião matinal do grupo. “É para a gente não perder a união”, diz uma líder.

“Parece mais cadeia do que casa”

O CTA, aberto semanas atrás, fica nos fundos de um terreno guardado por um muro de mais de três metros de altura e portas de metal sem uma fresta. “Parece mais cadeia do que casa”, disse uma mulher. “Parece que estamos trancados.”

Quando a reportagem visitou o lugar, havia dois carros da Guarda Civil Metropolitana no pátio do centro. Uma viatura da Polícia Militar revistou dois moradores enquanto eles saíam do CTA na manhã de hoje (13).

“É a terceira vez que acontece em dois dias. Eles estão enquadrando todo mundo”, disse um morador.

Nesta manhã, duas pessoas que haviam se recusado a se mudar do acampamento para o CTA tentaram entrar no centro, e foram proibidos. “Disseram que só podia quem veio na hora certa”, disse um dos líderes.

Outro lado

A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social afirma em nota que “manteve diálogo constante com o comitê formado por representantes das famílias, informando sobre o andamento das obras do CTA e a sua finalidade”.

As regras do centro, afirma o órgão municipal, “são formatadas não só pela administração quanto pelos próprios conviventes, para que todos estejam em comum acordo e possam, assim, conviver harmoniosamente”.

A prefeitura afirma ainda que não há um prazo estipulado para a permanência desse grupo no CTA.

No Paissandu

Enquanto isso, o largo do Paissandu já não tem mais vestígios do acampamento que durou quase cem dias. O chão foi lavado, o lixo retirado e funcionários da barraca de flores que funcionava em meio ao acampamento afirmam que o movimento está voltando ao normal.

A Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, que fica no meio do largo, só volta a abrir na próxima semana, disseram funcionários do local. O lugar, afirmaram, vai ser limpo e desratizado até lá.

Utilizamos cookies, próprios e de terceiros, que o reconhecem e identificam como um usuário único, para garantir a melhor experiência de navegação, personalizar conteúdo e anúncios, e melhorar o desempenho do nosso site e serviços. Esses Cookies nos permitem coletar alguns dados pessoais sobre você, como sua ID exclusiva atribuída ao seu dispositivo, endereço de IP, tipo de dispositivo e navegador, conteúdos visualizados ou outras ações realizadas usando nossos serviços, país e idioma selecionados, entre outros. Para saber mais sobre nossa política de cookies, acesse link.

Caso não concorde com o uso cookies dessa forma, você deverá ajustar as configurações de seu navegador ou deixar de acessar o nosso site e serviços. Ao continuar com a navegação em nosso site, você aceita o uso de cookies.