A eleição geral no Reino Unido, convocada pela primeira-ministra Theresa May com o intuito de aumentar o número de cadeiras do Partido Conservador no Parlamento, teve o resultado inverso do esperado: os primeiros números mostram que os britânicos elegeram menos parlamentares conservadores.
Essa perda de apoio dos conservadores põe em dúvida a continuidade de May no cargo de primeira-ministra, uma vez que no sistema parlamentarista o chefe de governo é escolhido pelo partido que tiver maioria no Congresso — ou por uma coalizão de partidos que formem a maioria.
Para garantir essa maioria, são necessárias ao menos 326 das 650 cadeiras da Câmara dos Comuns — equivalente à nossa Câmara dos Deputados. May convocou as eleições com o objetivo declarado de ampliar o apoio que seu partido tinha no Parlamento, a fim de aprovar as medidas do Brexit com mais rapidez.
Nenhum dos partidos ganhou maioria absoluta. Os conservadores foram os mais votados, mas devem conseguir apenas 318 cadeiras — antes, a primeira-ministra contava com 343 deputados de seu partido. Os trabalhistas, por sua vez, tiveram um resultado melhor que o esperado, e devem eleger 262 representantes.
Theresa May continua primeira-ministra, ao menos por enquanto
Mesmo com a derrota, May declarou na manhã desta sexta-feira (9) que pretende continuar à frente do governo. Para tanto, ela deverá negociar com outros partidos menores uma coalizão a fim de formar maioria.
Isso não impede, entretanto, que os outros partidos tentem entre si formar uma maioria para tirar do Partido Conservador o direito de escolher o primeiro-ministro.
Se outra coalizão de partidos formar maioria sem os conservadores, May será obrigada a renunciar ao cargo, e a nova coalizão é obrigada a provar que tem a maioria dos votos. O mais cedo possível desse cenário acontecer é semana que vem, até terça-feira (13).
Caso isso não ocorra — e nenhum partido ou coalizão conseguir formar maioria absoluta —, May terá mais uma semana para tentar resolver a questão. Aí os conservadores teriam que aprovar o próximo programa legislativo a fim de provar que são capazes de formar um governo.
Nesse caso, se novamente os conservadores falharem em conseguir maioria, May teria que dar lugar ao líder do segundo maior partido — Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista, viraria primeiro-ministro (e teria que conseguir maioria...).
Se May deixar de ser primeira-ministra, terá sido a ocupante do cargo mais breve desde 1922, quando o conservador Bonar Law renunciou por problemas de saúde.
Se nada disso der certo, o Reino Unido pode ter outra eleição ainda este ano. Nesse cenário, o (novo) pleito provavelmente seria em agosto.
Enquanto isso, a União Europeia pressiona o Reino Unido pelas negociações do Brexit. Na manhã desta sexta, o presidente do Conselho Europeu — mais alto órgão da União Europeia —, Donald Tusk, tuitou que todos devem trabalhar para chegar a um acordo.
"Nós não sabemos quando as negociações do Brexit começam. Mas sabemos quando elas devem terminar. Deem seu melhor para evitar que não cheguemos a um acordo."
A análise era uniforme a partir de outros países. O primeiro-ministro francês, Édouard Philippe, disse que o resultado da eleição britânica é surpreendente mas não coloca em questão o Brexit, segundo a agência France-Presse.
Questionada sobre o assunto, uma autoridade alemã disse que não iria comentar o resultado por "respeito e educação" — o que é revelador por si só.
Imaginada para dar mais estabilidade ao processo de saída da União Europeia, a eleição — e seu resultado inesperado — adiciona incerteza ao Brexit. Assim que ficou claro que May perdera a maioria do Congresso, ativistas conservadores passaram a dizer que as negociações estariam reabertas, como a possibilidade de saída do mercado comum.
O problema, para o Reino Unido, é que dificilmente a posição da União Europeia em relação ao tema vai mudar: os britânicos não poderão continuar no mercado comum sem aceitar o livre movimento de pessoas.
Com reportagem de James Ball, Jim Waterson e Alberto Nardelli. Adaptação de Alexandre Aragão.